*Mhario Lincoln
Essas, por não se anunciarem, são muitas vezes invisíveis para os outros — mas não para quem as vive. Neste caso, minha amizade e respeito por Fernando Sousa, jornalista e radialista maranhense. A amizade invisível nasce do reconhecimento mútuo, da sintonia que não exige presença constante, mas se fortalece sempre que os caminhos se cruzam.
Dois amigos da mesma profissão, unidos pelo trabalho em uma empresa, iniciaram essa espécie rara de laço. Um, veterano, exemplo e referência; o outro, aprendiz atento, mais novo, mas já dono de escuta madura.
Nunca saíam juntos, não se ligavam, nem combinavam cafés ou confraternizações. No entanto, bastava um encontro ocasional, uma coincidência qualquer — como aquele almoço no restaurante do Shopping Tropical, em São Luís — para que o tempo desaparecesse e a conversa se prolongasse por horas, com a leveza de quem nunca se afastou.
Esse tipo de amizade carrega uma sabedoria ancestral. Como escreveu Aristóteles em sua Ética a Nicômaco, “a amizade perfeita é a que existe entre os bons e semelhantes em virtude”. Não é baseada em utilidade ou prazer passageiro, mas na admiração genuína, na confiança sem exigências.
Há uma delicadeza nisso. Um não cobrar do outro presença, mas saber que, no instante em que se sentarem à mesma mesa, tudo voltará a fluir — como se a conversa tivesse apenas sido colocada em pausa.
O filósofo romano Sêneca também deixou pistas sobre essa amizade silenciosa. Em uma de suas cartas a Lucílio, ele afirma: “Um amigo é alguém com quem se pode pensar em voz alta.” E, de fato, a amizade invisível permite isso: quando se reencontram, os amigos falam sem máscaras, sem introduções. Não é necessário atualizar a vida. A profundidade está no momento, e não no tempo passado juntos.
Em um mundo viciado em presença, em mensagens imediatas e confirmações constantes de afeto, "a amizade invisível", termo que eu cunhei para esta situação, é um ato de resistência. Ela ensina que a amizade, mesmo, não precisa de vigilância. Que o respeito está em compreender o tempo do outro e, sobretudo, em saber não desperdiçar o tempo raro em que se encontram.
Esse tipo de amizade não está nos álbuns, mas está na memória afetiva. Não aparece nos stories, mas é lembrada nos momentos cruciais. É uma conexão que não se mede por frequência, mas por intensidade. Quando os dois se veem, algo se alinha: o tempo desacelera, o mundo se cala, e só existe aquele diálogo — como uma entrevista espontânea que eu fiz com ele, talvez uma das últimas, públicas, dele.
E quando um dos dois for primeiro, caro Fernando Sousa, essa amizade continuará existindo — não como ausência, mas como presença que vive nos diálogos gravados no coração. Porque amigos assim não morrem, apenas repousam na espera do próximo reencontro. E quando ele vier, será como sempre foi: longo e verdadeiro.
Até breve, amigo.
Mhario Lincoln é presidente da Academia Poética Brasileira.
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