Nauro Machado escreveu sobre o teatrólogo Ubiratan Teixeira. O texto apresenta o livro "Dicionário de teatro", edição GEIA 2005. A 1ª edição foi lançada em 1970, sob o título "Pequeno Dicionário de teatro".
Nota do Editor: a obra de Ubiratan Teixeira é um clássico nacional, um guia importantíssimo para quem faz teatro no Brasil, é emocionante para toda a equipe do Facetubes, pois revive a escrita de um dos incomensuráveis nomes da literatura brasileira, nascido maranhense: poeta Nauro Machado. Trata-se do "Dicionário de teatro", de Ubiratan Teixeira, relançado pela Editora Instituto Geia, em 2005. Na verdade, com esta reedição, o Instituto Geia fortaleceu a "Coleção Geia de Temas Maranhenses", criada para divulgar obras de alto significado para a historiografia desta região. Sabe-se que o "Dicionário de teatro" é o resultado de anos a fio de trabalho e dedicação do seu autor às artes teatrais, compilado em cursos, palestras, seminários, ensaios, encenações e contatos com atores, diretores, produtores, mestres artesãos e plateia, pelo imortal Ubiratan Teixeira, nascido em São Luís do Maranhão. Novelista, contista, ensaísta, teatrólogo e jornalista. Um detalhe interessante: o projeto gráfico e acabamento é de Arlete Nogueira da Cruz, esposa de Nauro Machado.
Desta forma, com esta matéria, prestamos mais uma homenagem a Nauro Machado, abaixo:
O PALCO COMO EXISTÊNCIA
Nauro Machado
Este livro, pesquisado com fé de apóstolo e desenvolvido ao longo de muitos anos, no intervalo de uma escrita voltada para a criação literária de vários gêneros, é o testemunho de uma paixão exercida entre duas posturas de vida, pelo seu autor indissociáveis; na existência factual e no palco imaginário, como representação das inúmeras personas com as quais Ubiratan Teixeira revela a urdidura dos enredos que lhe exteriorizam o drama e/ou a comédia de pensar o ser e o mundo - esta forma teatral por excelência.
Os bastidores onde se desenrola essa ação são aqui abertos e postos à mostra como espelhos da corporeidade mais extremada e com a competência de uma restauradora cirurgia plástica, de minúcia impressiva, a que não falta a incisão exata no tecido do glossário utilizado.
Prova disso é a afortunada indignação com que Ubiratan Teixeira não há muito fustigou, defendendo o templo que lhe é sagrado, aqueles que, por força de um solipsismo mais que redutor, lhe atribuíram propositalmente falhas, por não saberem que ele, além da consistente cultura teatral, absorve e considera o Teatro como a verdadeira transparência do Ser, algo à maneira kierkgaardiana, abrindo-lhe as cortinas para um palco onde possa monologar dialogicamente com a própria divindade.
Não escamoteando o ser-em-si, na interioridade que lhe internaliza as emoções, Ubiratan Teixeira, criador de algumas obras-primas do conto brasileiro contemporâneo, consegue desdobrar-se neste Dicionário de teatro, na sua condição de autor-ator, espectador e intérprete do palco mundi que, para ele, é o proscênio ainda provinciano de nossa São Luís do Maranhão.
Diríamos, após a leitura deste livro, que a arte teatral não possui nenhum segredo para Ubiratan Teixeira, este escafandrista a lembrar-nos curiosamente, para nós que fomos apaixonados cinéfilos no tempo em que o Teatro Artur Azevedo era também cinema, aquele Fantasma da ópera, interpretado por Claude Rains, ou o torturado Hamlet, interpretado por Sir Laurence Olivier, cumprindo a vingança pelo assassinato do pai.
Convém lembrar que o Teatro Artur Azevedo, de São Luís, pode servir de ponto de partida para qualquer estudo que se queira fazer da realidade cênica maranhense, nele confundida, através dos últimos 50 anos, com os espetáculos ali realizados (alguns deles pelo próprio Ubiratan) no espaço de um palco e diante de um ciclorama a confundir-se naquele tempo com a tela cinematográfica
Lembramos, por exemplo, do impacto que nos causou Sérgio Cardoso no papel de Hamlet, encenado ali pelo Teatro do Estudante do Brasil, cujo paradigmal nome passou a ser conhecido do até então acanhado e satisfeito público frequentador da Casa de Apolônia Pinto. E mais: aqui já havia, para contrabalançar esse provincianismo cultural, um pequeno grupo de escritores católicos, tendo à frente o depois padre João Mohana, secundado por Ubiratan Teixeira e poucos outros, que se propunha, com seriedade, talento e propósito modernista, à revitalização do nosso Teatro, por meio de um enfoque dado sobretudo aos textos movidos pela problemática religiosa de um Claudel, Ghéon, Bernanos e muitos outros.
Com uma viagem que ganhou à Europa para estudar Teatro, graças à visão e sensibilidade de Paschoal Carlos Magno, Ubiratan Teixeira se revelaria logo depois, voltando para São Luís, como o mais respeitado teórico e o mais profundo conhecedor de Teatro, entre nós. Ele é, dessa maneira, na sua função exemplar de teatrólogo, contista, romancista, cronista, repórter, memorialista, professor de arte dramática, cristão não ortodoxo, católico sem aura de santidade e incansável estudioso da literatura universal, um dos nossos raros e conscientes escritores que se tem negado a escamotear os meandros da psique humana, onde a alma pulsa como mercadoria inegociável, elastecendo aquela vontade
Representação de um mundo que Ubiratan Teixeira, com a pertinácia da sua vontade, revela agora a todos nós, através desta exuberante segunda edição de seu Dicionário - necessário, didático e autoral -, de amplas perspectivas aqueles que consideram não só o Teatro, mas a Arte, como a razão maior da Vida.
Nauro Machado
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