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Quando um “Carpe Diem” é ressignificado em soneto, cordel e fé epicurista

Mhario Lincoln é presidente da Academia Poética Brasileira.

15/11/2024 às 19h55 Atualizada em 15/11/2024 às 20h12
Por: Mhario Lincoln Fonte: Mhario Lincoln
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Esmeralda Costa. Arte: mhl
Esmeralda Costa. Arte: mhl

Mhario Lincoln 

 

Quando conheci Esmeralda Costa a primeira impressão ligou-a diretamente ao "Cordel" e ao "Soneto". Mas, algo me levou a estudá-la de uma forma diferenciada. Ela parecia estar em um momento poético mais abrangente, experimentando novos caminhos líricos tão importantes quanto a Literatura de Cordel, dificílima de construir em sua forma original, fato que ela faz tão bem, buscando a alma orientadora do nosso amigo comum, o Pedro Sampaio, em seu estilo e suas ideias. Aliás, eles foram parceiros no primeiro grande trabalho da confreira Esmeralda.

O importante é que eu descobri algo novo ao ler, sentir e interpretar o poema "Carpe Diem", intrinsicamente inverso ao seu papel cordelista, intuindo em algo, possivelmente, de expressão evolutiva, isto é, ampliando os horizontes da construção poética pessoal, fato direcionador na aplicabilidade mais madura e consciente dos cordéis regionais que ela faz.

Assim, trazer o poeta latino Horácio para o contexto, é também fascinante, da mesma forma em que traz Luiz Gonzaga, ou mesmo Arievaldo Viana, patrono da Academia Cearense de Literatura de Cordel e tantos outros que fazem do Nordeste, um celeiro de produções internacionais, seivas brasileiras desse gênero de literatura.

Aliás, Horácio, em suas "Odes" (Livro I, Ode 11), escreveu: "Carpe diem, quam mínimo credula postero", que se traduz como "aproveita o dia e confia o mínimo possível no amanhã". É bom relembrar: tecnicamente, Horácio, influenciado pelo epicurismo, propôs uma reflexão sobre a efemeridade da existência e a importância de desfrutar dos prazeres presentes. Desta forma, a busca pelo prazer moderado e pela ausência de sofrimento eram caminhos para a felicidade.

Todavia, no poema de Esmeralda Costa, o "Carpe Diem", essa máxima é reinterpretada de forma brilhante e ganha novos contornos, enfatizando valores como amor, paciência e espiritualidade. Muito além da visão de Horácio. Basta um pouco mais de atenção para embebedar-se com os versos da confreira APB-CE, através de conceitos filosóficos, sociológicos e poéticos, destacando, destarte, como a autora ressignifica o clássico "Carpe Diem", para um contexto contemporâneo, moderno, enigmático.

E vou mais longe convidando para sentar-se em minha mesa, Michel de Montaigne. Em seus "Ensaios", ele também refletiu sobre a condição humana e a necessidade de viver plenamente. "A vantagem do viver é não pensar na morte" ("Ensaios", Livro I). Montaigne enfatizava a importância de uma vida vívida com melhorias e consciência do presente, sem a angústia constante pelo futuro incerto.

Assim, Esmeralda Costa, nesse seu poema específico, (veja que beleza) desloca o foco do "Carpe Diem" da busca individual pelo prazer, para uma perspectiva altruísta e espiritual.

"Carpe Diem para amar mais / Carpe Diem para não ferir jamais". Aqui, a autora transforma o imperativo clássico em um apelo ético ao amor ao próximo e à não-violência. No trecho "Carpe Diem para ser mais humano / Carpe Diem para evitar o profano", ela sugere uma evolução moral e espiritual do indivíduo. A expressão "evitar o profano" indica um afastamento de atitudes negativas ou superficiais, promovendo uma conexão mais profunda com valores elevados, na verdade, refletindo a função da religião e da espiritualidade como instrumentos de coesão social e orientação ética.

Ao declarar “Carpe Diem, porque Deus é o Autor da criação”, a poeta incorpora uma dimensão teológica ao conceito. Diferentemente de Horácio, cuja abordagem era mais secular, Esmeralda Costa enraíza o "Carpe Diem" na fé e em um criador divino, atribuindo a Deus a motivação suprema para agir com firmeza e propósito. Isso se alinha com visões filosóficas que veem a vida como um dom divino a ser honrado através de ações virtuosas.

Estou realmente maravilhado com a virada de interpretações dada pela autora nascida Ceará e residindo em Campos Sales/CE. Vejam que extraordinário: o uso repetido da anáfora "Carpe Diem" no início de cada verso serve para enfatizar a urgência e a importância das ações propostas. Em um segundo momento, mais atento, eu notei a razão dessa estrutura, ou seja, para criar um ritmo cadenciado, a fim de reforçar a mensagem central do poema. Além disso, as rimas e a simplicidade da linguagem tornam o poema acessível, amplificando seu apelo emocional e moral.

Eu até poderia chamar esse trabalho dela de releitura, ressignificação. Todavia, é mais que isso. É transformador ver a ideia original de Horácio ser, nestas linhas, um chamado moderno, contemporâneo de ação positiva, com direcionamento espiritual.

É claro que enquanto Horácio e Montaigne enfatizam a necessidade de aproveitar o presente devido à incerteza do futuro, Esmeralda direciona essa urgência para a construção de um mundo melhor, fundamentado no amor, na alegria e na fé.

Nada mais justo do que chamá-la à mesma mesa e dizer: parabéns Esmeralda Costa. Só os bons conseguem ler, entender e ressignificar um marco histórico da filosofia histórica. Assim, cara confreira, "carpe diem", com fé, esperança e amor.

 

Mhario Lincoln é presidente da Academia Poética Brasileira.

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Carpe Diem

 

Carpe Diem para amar mais

Carpe Diem para não ferir jamais 

Carpe Diem para fazer o bem

Carpe Diem porque você pode ir além.

 

Carpe Diem para espalhar alegria

Carpe Diem para que seja o melhor dia

Carpe Diem para ser o melhor aprendiz 

Carpe Diem, porque você merece ser feliz.

 

Carpe Diem para fazer amizade

Carpe Diem para espalhar felicidade

Carpe Diem para espalhar emoção 

Carpe Diem, porque o amor vem do coração.

 

Carpe Diem para ser mais humano

Carpe Diem para evitar o profano

Carpe Diem para elevar a melhor oração 

Carpe Diem, porque Deus é o Autor da criação.

 

Carpe Diem para louvar as obras de Suas Santas Mãos

Carpe Diem para tratar bem os irmãos 

Carpe Diem para superar a dor

Carpe Diem para espalhar paz e amor

 

(Esmeralda Costa)

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Carmen Regina DiasHá 2 semanas CascavelE segue o mestre: Esmeralda Costa, em Carpe Diem desloca o foco do "Carpe Diem" da busca individual pelo prazer, para uma perspectiva altruísta e espiritual. "Carpe Diem para amar mais / Carpe Diem para não ferir jamais". Enquanto Horácio e Montaigne enfatizam a necessidade de aproveitar o presente devido à incerteza do futuro, Esmeralda direciona essa urgência para a construção de um mundo melhor, fundamentado no amor, na alegria e na fé. Palmas e mais palmas para a Poeta e o mestre.Belíssi
Carmen Regina DiasHá 2 semanas CascavelPara ler sem pressa...refletindo... Estou pasma com a análise do mestre ao poema de Esmeralda Costa. "No trecho "Carpe Diem para ser mais humano/ Carpe Diem para evitar o profano",ela sugere uma evolução moral e espiritual do indivíduo. "evitar o profano" indica um afastamento de atitudes negativas,superficiais, promovendo uma conexão mais profunda com valores elevados,refletindo a função da religião e da espiritualidade como instrumentos de coesão social e orientação ética. (...segue)
alcina maria silva azevedoHá 2 semanas Campinas -SPCarpe Diem, ao termos sempre a possibilidade em ler poemas como este. Parabéns Esmeralda Costa! Deixamos de curtir grandes momentos presentes, preocupados com o futuro.
Pedro Sampaio Há 2 semanas Fortaleza Ce Quem usava de outro a poesia/E ouvia o outro profetizar/ Que uma poetisa estaria a camuflar/ O profetizador é claro estava certo/ E insistia pra ela se revelar/ Eis que surge Sentimentos na Pandemia/ E sua poesia veio se descortinar/ Nascendo pra orgulho de cearense/ Esmeralda a nossa camposalense/ Grande Artista na arte de versar/ Inspiração infinita/ Na Poesia Popular ou Erudita/ Ela nasceu pra na APB brilhar/Ter de Mhario Lincoln aprovação/A Deus é louvar em gratidão/E seguir na vida a versar
Esmeralda CostaHá 3 semanas Campos Sales-CE Magnífica análise, meu querido mestre Mhario Lincoln. Eu já tinha um grande carinho por este poema e a partir desta sua resenha o carinho tornou-se amor imenso. Minha especial gratidão, por tão precioso texto sobre o nosso poema Carpe Diem!
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