Editoria-Geral, Plataforma Nacional do Facetubes.
São João (Batista) permanece, dois milênios depois, como uma figura singular na fé católica e na cultura popular brasileira. Celebrado hoje, 24 de junho, ele é ao mesmo tempo santo e símbolo festivo – um profeta venerado pela Igreja e o padroeiro informal das alegrias juninas.
A Plataforma Nacional do Facetubes, por meio de sua editoria-geral, celebra nesta data o legado deste precursor de Cristo, cuja vida e morte ecoam lições de coragem, fé e comunhão.
Em um tempo de mudanças culturais e religiosas, lembrar São João Batista é reafirmar valores que atravessam os séculos. Dentro da tradição católica, São João Batista ocupa um lugar único. Ele foi o último dos profetas bíblicos, aquele que anunciou a vinda iminente do Messias e o precedeu “no caminho”.
Filho do sacerdote Zacarias e de Isabel – nascido milagrosamente de uma mãe até então estéril –, João veio ao mundo cerca de seis meses antes de Jesus. Desde o ventre materno já manifestou sua missão, exaltado nos Evangelhos como “a voz que clama no deserto” a preparar os caminhos do Senhor. Vestido em pele de camelo, alimentando-se de gafanhotos e mel, ele abraçou a vida ascética no deserto e pregou com firmeza a conversão, sem temer confrontar as injustiças de seu tempo.
Foi ele quem batizou Jesus nas águas do rio Jordão, testemunhando o Espírito Santo descer em forma de pomba e ouvindo a voz divina proclamar Cristo como Filho de Deus. O próprio Jesus exaltou João Batista como o maior entre os nascidos de mulher.
Essa estatura espiritual, porém, não poupou João do destino dos profetas: sua voz incisiva contra a corrupção e o incesto na corte de Herodes Antipas levou-o à prisão e ao martírio por decapitação. Morreu jovem, mas deixou um exemplo indelével de integridade e bravura moral.
Por que, então, celebrar São João Batista com festas tão exuberantes, especialmente no Nordeste brasileiro? A resposta remonta à junção de fé e cultura. O dia 24 de junho marca, segundo a liturgia, o nascimento de João Batista, uma distinção que ele divide apenas com Jesus e Maria – já que a maioria dos santos é lembrada no dia da morte.
No período colonial, os portugueses trouxeram para o Brasil a tradicional festa de São João, que coincidia com antigos ritos do solstício de verão europeu, cristianizando-os. Nasceu assim a festa junina, que enraizou-se profundamente no país. Conta a tradição que Isabel, mãe de João, acendeu uma fogueira no alto de um monte para avisar sua prima Maria do nascimento do menino.
Por isso, até hoje, acendem-se fogueiras na noite de São João – símbolo cristão que substituiu os antigos cultos pagãos do fogo sem apagar sua essência de luz e confraternização. No Brasil, especialmente no Nordeste, São João tornou-se sinônimo de festa popular. As comemorações juninas misturam sagrado e profano: missas e procissões dão graças ao santo, enquanto arraiás comunitários celebram com fogueiras, balões, músicas, danças, comidas de milho, bebidas e alegria transbordante.
Não por acaso, dizem no sertão que “não há vida plena sem festa em junho” – se a noite de São João passar em branco, “o ano estaria perdido”. A figura do santo, carinhosamente chamada de “São João do Carneirinho” em cantigas, inspira um clima de alegria quase mística.
É uma devoção festiva que revela, como escreveu um autor, “um Deus amável e dionisíaco, materializado na farta alimentação, músicas, danças... e na marcada tendência às adivinhações e superstições” próprias do povo.
Também a tradição piedosa conta que o menino João foi salvo por intervenção divina do massacre dos inocentes promovido por Herodes – escondido no deserto por sua mãe, escapou da fúria assassina que vitimou tantas crianças.
Em muitas comunidades, fiéis atribuem a ele graças e curas alcançadas por oração. Os testemunhos se acumulam: há quem diga ter sido salvo de enfermidade grave após clamar pelo santo, como a avó maranhense que viu seu neto, entre a vida e a morte, recuperar-se logo depois da fervorosa oração que ela fez a São João.
Além da fé, São João Batista deixou uma influência cultural e ética profunda. Ele personifica o arquétipo do profeta destemido, daquele que denuncia as injustiças e sacode a acomodação das sociedades. Sua “rebeldia” inspiradora já foi chamada de a festa dos subalternos – uma celebração dos humildes contra as forças que tentam silenciar a alegria e a esperança.
Celebrar São João, portanto, carrega também um componente de resistência cultural: é afirmar que alegria comunitária, gratuidade e fé popular têm lugar em nosso mundo. Como o próprio Batista, que incomodava os poderes constituídos, a festividade junina teima em sobreviver, lembrando que a verdadeira fé pode – e deve – vir acompanhada de alegria e inclusão. Podem até tentar suprimir a festa ou derrubar os mastros dos santos; mas, “se João se calar, as pedras gritarão”.
Então, Viva São João!