Esta matéria foi publicada em uma das revistas literárias mais importantes de Portugal:
@ROSSINI CORRÊA
Mhario Lincoln é um consumado artista multimídia, pioneiro em meio à sua geração maranhense, na precoce descoberta de que o mundo se tornaria aquela aldeia global vaticinada por Marshall McLuhan. Compreendeu o poeta de "A Bula dos Sete Pecados", desde a hora zero, o papel que as comunicações teriam no futuro em construção, tornando possível, por cima das assimetrias, a construção de diálogos de civilizações, pulsantes, e em busca de um mundo só.
Na aurora do seu tempo, Mhario Lincoln já era um homem de comunicação. Jornalista, Advogado, Cronista; do intelectual em questão, pode-se dizer que, em todos os domínios de sua intervenção, havia a presença do signo dialógico, a revelar a condição de homem-ponte, que reservara existencialmente para si, em uma disposição de serviço à vida, como serviço ao outro.
Mhario Lincoln guardava, entretanto, dentro de si, mananciais criativos multifacetados, que o tempo se encarregaria de trazer à superfície do mundo visível. Eis que o Poeta, o Músico e o Filósofo pediriam que as alas se abrissem, para que pudessem passar sem atropelo de nada nem de ninguém. Ser gregário por excelência, o protagonismo lincolniano tinha por vocação ser exercido na ilha e no continente, com a merecida amplitude do sentimento do mundo em si carregado, a reclamar a sua pronúncia como testemunho do canto, a ser compartilhado como pão da vida, cujo destino é iluminar os espíritos. Assim nasceu o verbo em coral, mergulhado em águas profundas e a sobrenadar sabedoria:
DA DERROTA TOTAL AO REPRINCÍPIO
(Soneto para Shakespeare)
Nem só de principados vive o Homem, nem de aparência.
Fui e vim ao largo de minha angústia, de corvo a colibri.
Foi-me dada a oportunidade do arrependimento com decência.
Foi-me dada a chance de mudar o tudo ou o nada, que vivi!
Imprudência, ganância, autopiedade, desordens, luxúria.
Fui e vim, ao largo de minha prepotência, lavando as mãos.
Foi-me dada a hora de ajuizar-me e reconhecer toda penúria.
Foi-me concedido o direito de rever meus mimos e padrões.
A morte, foi-me companheira ao longo desses inteiros anos.
Fui e vim na certeza de que era perseguido até pelos meus.
Foi-me dada a acontecer minha paz, sem pensamentos levianos.
Foi-me retribuído o perdão e aflorou a graça maior de Deus.
Justos os que se fizeram nas entranhas do gueto.
Emergiram da lama, aceitando a derrota. Puro sueto!
(Mhario Lincoln).
De corvo a colibri, o canto lincolniano, ave espalmada no céu da vida do mundo, tematizou alfa e ômega, em busca do sentido do existir, portando uma vontade visceral de transformar pedras em frutos, abismos em montanhas, perguntas em respostas: “Acabou, Tomás de Torquemada, toda maldade?” O itinerário do Poeta revolveu os problemas da vida e os mistérios da morte – “Desço a grande escada da Nuvem” – em uma sondagem do Ser, do Nada e do Tempo, na qual procurou a floração de antídotos para a gula, a avareza, a luxúria, a ira, a inveja, a preguiça e a vaidade, convicto de que, pelo puro e pelo belo, há de começar a reinvenção da vida do mundo. Assim o canto se tornou libertação.
O fazer poético de Mhario Lincoln é um esmeril de lapidação do Ser e tem vínculo intimo com a tradição da escrita filosófica e poética por meio de aforismos. Não por acaso, mas por consciente intertextualidade, "A Bula dos Sete Pecados" carrega consigo o galo que Friedrich Nietzsche sonhou que explodisse em luz, em meio às madrugadas da Alma, como forma de remissão de tudo que é humano, demasiado humano. Diante do espelho do verbo e do espírito natalino, resta-nos, com certeza, pedir ao Poeta que cante a música desse canto, de onde, teimosa e incorruptível, por sobre as trevas do mundo, renasce em vida a Esperança.
Rossini Corrêa: Advogado, Escritor e Filósofo do Direito, com mais de 40 livros publicados, entre os quais se destacam: Saber Direito-Tratado de Filosofia Jurídica; Jusfilosofia de Deus; Crítica da Razão Legal; Bacharel, Bacharéis: Graça Aranha, discípulo de Tobias e companheiro de Nabuco; Teoria da Justiça no Antigo Testamento; José Américo, o Jurista; Política Externa Independente: contribuição crítica à história da diplomacia nacional; O Liberalismo no Brasil: José Américo em perspectiva; Brasil Essencial: para conhecer o país em cinco minutos; O Bloco Bolivariano e a Globalização da Solidariedade: bases para um contrato social universalista; e Romeu e Julieta no Brasil. É membro titular do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal – IHGDF. Pertence à Academia Brasiliense de Letras – ABrL e à Academia Maranhense de Letras – AML. É Patrono da Cátedra Gonçalves Dias, da SVT Faculdade de Ensino Superior e foi Coordenador da Cátedra Daisaku Ikeda, do Centro Universitário de Goiás-Uni-Anhanguera.