
Plataforma Nacional do Facetubes/Editoria de Memórias c/Mhario Lincoln
A caneta BIC Cristal entrou no mercado em dezembro de 1950 — há 75 anos — com a promessa simples e revolucionária de oferecer escrita confiável, barata e democrática. Nasceria ali um ícone industrial que atravessaria salas de aula, balcões de repartição, redações e tribunais, a ponto de ganhar lugar permanente no acervo do MoMA como peça de design essencial. A mesma haste hexagonal transparente que cabe no bolso da camisa também cabe na história afetiva de quem aprendeu a escrever com ela. Desde então, a BIC assinou “poucas e boas”: termos de admissão e demissão, absolvições, promessas de amor rabiscadas no caderno, bilhetes de desculpa e versos que salvam dias ruins.
No Brasil, a caneta virou até refrão: “Caneta Azul”, hit do maranhense Manoel Gomes, explodiu como meme em 2019 e rendeu ao cantor um álbum homônimo lançado em 21 de agosto de 2020 — prova de que às vezes um objeto banal é o próprio gatilho da memória coletiva.
A onipresença da BIC também esbarra nos ritos do poder. Alguns presidentes da República assinaram atos e decretos com BIC, transformando a esferográfica popular símbolo público.
Mas o alcance da BIC vai além do cotidiano e da política: ela consolidou a ideia criativa no gesto do escritor. A mesma ponta de tungstênio que não falha diante do papel segura o compasso do pensamento quando o poema chega. E é por isso que tanta prosa, crônica, ensaio e conto começa com o estalo de um risco azul.
Não é preciso afirmar que a maioria dos poetas brasileiros escreveram “com BIC” por reconhecer que a caneta esferográfica, tornada acessível a partir de 1950, ajuda a estabilizar a mão de quem escreve. Inclusive para poetas que vieram muito depois, vivendo estes nossos dias de 2025, no Brasil e no mundo.
No campo das artes visuais, a BIC é pincel. A artista dinamarquesa/brasileira Birgitte Tümmler constrói séries inteiras em esferográfica — abelhas nativas, aves brasileiras, fauna de Curitiba — levando a caneta a um nível de detalhe que parece bordado de luz. Suas mostras e declarações públicas cravam a esferográfica (aquela do estojo escolar) como técnica preferida. Sobre isso, afirma o jornalista Mhario Lincoln:
- Eu convidei o confrade APB-PR, Ormarosman Aedo para entrevistar uma das grandes artistas visuais do Planeta, que naquela época morava em Curitiba (PR). Mas ela nasceu na Dinamarca, para onde retornou há 2 anos. Foi um momento muito especial. Tudo está publicado na Plataforma Nacional do Facetubes: ( https://www.facetubes.com.br/noticia/3296/veja-o-que-o-talento-e-a-criatividade-podem-fazer-usando-canetas-esferograficas ) e no vídeo, logo abaixo do texto.
Entre os nomes internacionais, o coreano-americano Il Lee fez da caneta esferográfica matéria de abstrações monumentais, com retrospectiva em museu e exposições recentes dedicadas à sua “nova” fase da esferográfica.
Tanto que a própria BIC já celebrou edições especiais ligadas a sua obra. Do outro lado do espectro, o espanhol Juan Francisco Casas leva a BIC azul ao hiper-realismo fotográfico; galerias e plataformas de arte registram trabalhos recentes: “BIC ballpoint pen”. Esse duplo movimento, do gesto livre ao virtuosismo minucioso, explica por que a caneta histórica, virou ferramenta nobre.
Talvez por isso a BIC continue onde a vida pulsa: no bolso do jaleco do médico que anota um plantão, no capacete do engenheiro que rabisca um croqui, no balcão do comércio que fecha a conta, no caderno do professor que corrige a prova, no bloco do repórter que apura o fato, no caderno do poeta que garimpa silêncio.
Umas poucas gramas de plástico e metal, uma tinta que não seca, e a humanidade em andamento. Tudo passa no intervalo do primeiro traço infantil ao testamento.
Ao completar três quartos de século, a BIC segue sendo mais que um instrumento de escrita: é um pequeno rito de passagem portátil. Quando os dedos fecham sobre aquele hexágono transparente, a ideia ganha corpo.
E é aí que mora sua influência maior: lembrar, todos os dias, que o pensamento precisa de um corpo simples para existir. A caneta, afinal, ainda escreve “da primeira à última linha”, como promete a publicidade. Contudo, o que ela entrega mesmo é a coragem do primeiro risco.
VÍDEO-BÔNUS
Para quem quiser conhecer melhor os trabalhos de Tummler, siga o link: https://www.birgittetummler.com/
Mín. 15° Máx. 22°