Quinta, 15 de Maio de 2025
12°C 22°C
Curitiba, PR
Publicidade

Novo texto de José Cláudio Santana requer análise e reflexão: " O Andar da Carruagem"

Dr. José Cláudio Santana é convidado da Academia Poética Brasileira.

Mhario Lincoln
Por: Mhario Lincoln Fonte: Dr. José Cláudio Pavão Santana
22/12/2023 às 18h59 Atualizada em 22/12/2023 às 19h24
Novo texto de José Cláudio Santana requer análise e reflexão:
Arte: MHL

 

José Cláudio Pavão Santana*

Olhar atento e conhecimento sedimentado. Nas linhas traçadas pelo tempo e retratadas pelas rugas aquele velho homem bem sabia o que falava. Nem sábio, nem vidente, apenas consciente de que já havia vivido algo parecido.

Claro que a época era outra. Claro que o sentimento de identidade aflorava em um nacionalista tupiniquim, com vigor singular, próprio de outros tempos.

Talvez o velho homem indague a si mesmo se o que viu foi miragem; talvez, fruto da imaginação; um sonho? Nessa inquietação se põe a indagar respondendo a sim mesmo que tudo ficou estranho, muito estranho.

Perdeu-se a percepção concreta do que seja ter compromisso com os seus. Não com os bens materiais, mas com os que, como ele, se somam por identidade. Foram lançadas no esgoto a essência moral, a dignidade e o próprio discernimento entre licitude e ilicitude. O pronome possessivo virou sinônimo de sabedoria – eu diria – esperteza.

O velho homem busca no horizonte as datas celebradas, os compromissos cívicos, a postura institucional, o respeito e o culto aos símbolos. Só consegue enxergar vultos que se misturam em uma espécie de aglomerado.

A sensação do velho é de que uns poucos conseguiram subverter o óbvio, fazendo do comum extraordinário, elevando malfeitores a impunes, transmutando conceitos, verbalizando substantivos, invertendo o homem em uma espécie de repositório de vícios, que um dia foram virtudes.

Resta ao velho homem assistir a carruagem passando, com o nanismo físico e moral do conduzido e dos condutores, acompanhados de um séquito de covardes, coniventes, espertos e canalhas.

O velho só se vê assim (velho) diante do espelho, porque o olhar não envelhece e os virtuosos não são excepcionais. São apenas homens que conseguem compreender que valores e virtudes são essência do ser humano que não se deixou contaminar. 

O velho homem a tudo assiste, não sem antes ter a certeza de que sua indignação representa o singular nesses dias nublados.

Somos – parte de nós – um pouco desse velho. Indignados ao vermos a carruagem passar, puxada por zêmulas, que já não se distinguem dos homens  que deixam seus rastros no estrume oliva, se misturando ao odor das almas fétidas, caminhando na direção do abismo. 

Não somos velhos. Apenas, como ele, assistimos a destruição do que restava, com a certeza de que, impotentes, nada podemos fazer, além de evitar que o chicote nos açoite.

A paisagem é sem horizonte, até que surja um turbilhão capaz de varrer o lixo da escória.

O autor.

A carruagem passa, mas logo à frente está o abismo.

*********


O AUTOR: pós-Doutorado Universidade de Coimbra ("Ius Gentium Conimbrigae") Doutor em Direito do Estado (Constitucional) - PUCSP Mestre em Direito - FDR-UFPE Professor do Curso de Direito - e do Mestrado em Direito e Instituições do Sistema de Justiça daUFMA Associado da Associação Brasileira de Direito Processual Constitucional Membro do IBEC Membro da AMLJ Membro da ALL Membro IMADE Ver todos os posts por A PENA 

* O conteúdo de cada comentário é de responsabilidade de quem realizá-lo. Nos reservamos ao direito de reprovar ou eliminar comentários em desacordo com o propósito do site ou que contenham palavras ofensivas.
500 caracteres restantes.
Comentar
Mostrar mais comentários
Lenium - Criar site de notícias