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Ventos de antanho que trazem o verso forte da poeta e escritora Socorro Guterres

Socorro Guterres é convidada da Academia Poética Brasileira.

11/10/2024 às 09h39 Atualizada em 11/10/2024 às 10h04
Por: Mhario Lincoln Fonte: Socorro Guterres
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Arte: mhlai
Arte: mhlai

*Mhario Lincoln é editor-sênior da Plataforma do Facetubes e presidente da Academia Poética Brasileira.

 

Agora pela manhã me pus a analisar os versos de Socorro Guterres, enviado ao Facetubes. Antes do café comecei a fazer algumas anotações que, por sorte minha, acabaram se tornando o texto abaixo, após ler e reler esse poema épico dessa maranhense brilhante que saiu de São Luís para tornar-se ícone das palavras no sudeste brasileiro, através do seu livro de muito sucesso, "Nos Domínios da Linguagem (Veredas)", onde, quando li, também observei passagens plurinteressantes, raríssimas 'células-mater' da linguagem interpretativa, a partir de Roland Barthes e Ítalo Calvino. Aliás, é ótimo ter esses dois pensadores como referência. Isso porque, ao ler, o livro da professora Socorro, fica evidente essa fricção emotiva da vontade dela com o prazer do texto. De desnudá-lo, de buscar essências, de retirar as letras do sonambulismo. 

 

Então foi fácil analisar os versos (mais) abaixo, somando-o às sensações que havia vivido ao ler a obra citada. E deles, acabei acolhendo alguns mais significativos do poema, como "Houve um amor sem igual. E sobre ele muita história se fez", cuja essência destaca a intensidade e a singularidade do amor entre o Infante Pedro e a dama Inês de Castro, sentimento esse que desafiou as convenções sociais e políticas de sua época.

 

E como sempre trago para a mesma mesa, excertos filosóficos, esse verso escolhido representa o ideal do amor verdadeiro, transcendendo barreiras impostas pela sociedade. Historicamente, este amor proibido tornou-se uma lenda que marcou profundamente a cultura portuguesa. Jean-Jacques Rousseau, filósofo do século XVIII, afirmou: "O homem nasceu livre, e por toda parte se encontra acorrentado." Esta citação reflete o conflito entre a liberdade dos sentimentos e as restrições sociais que os aprisionam.

 

Outro verso crucial é: "Determinou aos seus ministros Que fossem em busca de Inês Para libertar Pedro Primeiro Do seu amor verdadeiro." Aqui, o rei Afonso IV toma medidas drásticas para separar os amantes, temendo ameaças à estabilidade do reino. Filosoficamente, este ato simboliza o embate entre o poder autoritário e os desejos individuais. Assim, a execução de Inês de Castro demonstra como a política pode interferir tragicamente na vida pessoal. Voltaire, pensador iluminista, escreveu: "A injustiça num lugar qualquer é uma ameaça à justiça em todo lugar." Esta reflexão enfatiza as consequências nefastas de ações tirânicas.

 

O verso "Assim, tão de repente, Vê-se com seu algoz frente a frente," retrata o momento fatídico em que Inês confronta seus executores e ilustra a fragilidade da vida e a impotência diante da opressão. Esse encontro culmina em sua morte injusta, tornando-se um símbolo da arbitrariedade do poder. Edmund Burke, filósofo do período, afirmou: "Para que o mal triunfe, basta que os bons não façam nada." Esta citação ressalta a responsabilidade coletiva em face da injustiça.

 

Na sequência, "Trouxe para a corte o cadáver da agora rainha Para lendária cerimônia De inusitado beija-mão" ilustra a resposta de Pedro à morte de Inês. Representa a busca por justiça e a tentativa de eternizar o amor além da morte. Um ato singular de coroar Inês postumamente demonstra a profundidade do sentimento de Pedro e sua revolta contra as injustiças sofridas. Immanuel Kant, que também o trago à mesa, afirmou: "Age de tal maneira que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na de qualquer outro, sempre como um fim e nunca apenas como um meio." Pedro, ao honrar Inês desta forma, reconhece seu valor intrínseco e sua dignidade.

 

Finalmente, o verso que me emocionou bastante: "Portanto, é melhor que se diga: Inês continua viva, Enquanto Amor existir," encerra o poema. E por que dessa emoção? Por ratificar a imortalidade do verdadeiro amor e sugerir que sentimentos profundos transcendem a existência física, ressaltando como a história de Pedro e Inês permanece viva na memória coletiva, sem se ter certeza absoluta se é apenas uma lenda.

 

Denis Diderot afirmou: "O amor é uma espécie de preconceito. Amamos o que precisamos, o que nos faz sentir bem, o que nos é conveniente." No entanto, a paixão entre Pedro e Inês desafia esta visão, representando um amor que ultrapassa conveniências e permanece constante através dos séculos e transcende a velha máxima usado por muitos, sem a percepção real do que ela possa representar: "Agora Inês é morta" é uma expressão idiomática portuguesa que simboliza a irreversibilidade de uma situação ou a inutilidade de lamentar algo que já aconteceu e não pode ser alterado. A origem dessa expressão está enraizada na trágica história de amor entre o infante Dom Pedro (futuro Pedro I de Portugal) e Inês de Castro, ocorrida no século XIV e desnuda o amor como 'indestrutível e imortal'.

 

A LENDA OU HISTÓRIA

Inês de Castro era uma dama de companhia da esposa de Dom Pedro, Dona Constança Manuel. Após a morte de Constança, Pedro e Inês viveram um intenso romance, mas seu relacionamento foi desaprovado pelo rei Afonso IV, pai de Pedro, devido a questões políticas e dinásticas. Temendo a influência da família de Inês e a possibilidade de instabilidade no reino, o rei ordenou a execução de Inês em 1355.

 

A morte de Inês de Castro provocou profunda dor e revolta em Dom Pedro. Segundo a lenda, quando ele assumiu o trono, mandou desenterrar o corpo de Inês e coroou-a rainha postumamente, obrigando a corte a prestar-lhe homenagens em uma macabra cerimônia de beija-mão. Embora haja controvérsias históricas sobre a veracidade desse evento, a história se perpetuou na cultura portuguesa como um símbolo de amor e tragédia.

 

Um dos versos mais impactantes do poema é: "Houve um amor sem igual. E sobre ele muita história se fez." Este verso introduz a magnitude do amor entre Pedro e Inês, um sentimento que transcende o tempo e se tornou lendário na história portuguesa. Filosoficamente, representa o ideal romântico de um amor que desafia convenções sociais e políticas. Historicamente, este amor proibido culminou em tragédia, mas também em uma narrativa que influenciou profundamente a cultura lusitana. Jean-Jacques Rousseau, filósofo do século XVIII, afirmou: "O homem nasce livre, mas por toda parte encontra-se acorrentado." Esta frase reflete a luta dos amantes contra as correntes impostas pela sociedade e pelo poder real.

 

A RELEITURA POÉTICA DE SOCORRO GUTERRES

 

INÊS É MORTA?

 

No reino de Portugal,

Em tempo medieval,

Houve um amor sem igual.

E sobre ele muita história se fez.

Era o amor do infante Pedro

Pela linda dama Inês.

Foi um amor conturbado,

Pois o príncipe era casado

E Afonso, o rei pai,

Não atentou ao clamor

Do filho enamorado.

Dona Constança Manuel

Consorte real, ratificada em papel,

De coração partido

Acabou por falecer

Ao sentir que o belo Pedro

Não podia lhe pertencer.

Contudo, deixou herdeiros

Consumando o trato estipulado

Para a sucessão futura

Que viesse a ocorrer.

Estando livre do compromisso,

Muitas jovens Dom Pedro recusou,

Alegando firmemente que seu coração

Ainda sangrava em dor.

Não se conformando o pai,

Com esses tais argumentos,

Sabendo que com Inês

Já havia rebentos,

Temendo estes filhos bastardos

Do poder se apoderarem

Determinou aos seus ministros

Que fossem em busca de Inês

Para libertar Pedro Primeiro

Do seu amor verdadeiro,

No momento em que sozinha

se encontrava a amada (e futura Rainha),

Com os longos cabelos loiros,

Caídos no colo aclamado

De Garça denominado.

Assim, tão de repente,

Vê-se com seu algoz frente a frente.

Mas antes da vil espada

Seu delicado corpo

Vir a transpassar

Inês faz sua súplica

Buscando na compaixão

Evitar aos seus filhinhos

Dantesca e atroz visão.

Mas tudo que clamou

Em inocente discurso

Só antecedeu do sepulcro uns míseros minutos.

Restaria ao amado,

Em caçada tão distante,

No retorno encontrar

O cadáver da amante.

Essa história retratada

Na arte da escritura como também na pintura,

Tem nos Lusíadas, talvez,

A voz mais marcante

Relatando da linda Inês o sossego,

Em saudosos cantos do Mondego,

Até a chegada do pai impaciente,

Tirando do filho Pedro a fantasia

Que o Amor Ardente construía.

Nem a piedosa voz,

Já embargada na saudade iminente

Do príncipe e dos filhinhos,

Impediu a orfandade carregada em mãos do avô inclemente.

Conta o poeta que as lágrimas choradas

Em fresca fonte se transformaram

E um nome adequado ao local foi colocado:

Fonte de Amores foi intitulado.

Mais tarde, em sua vingança,

Os homicidas Pedro alcança

E com as mãos em lança

Seus corações extirpa

Em cruel intemperança.

Mais tarde ainda,

Trouxe para a corte o cadáver da agora rainha

Para lendária cerimônia

De inusitado beija-mão,

A morte assim exalando

A dor em sua exaustão.

E sempre há de surgir

Algum trovador errante

Para falar dessa paixão distante,

E ainda assim constante.

Portanto, é melhor que se diga: Inês continua viva,

Enquanto Amor existir.

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Liliana Silva Braúna Há 4 semanas Rio de JaneiroQue leveza nas letras dessa releitura poética...Socorro Guterres, sempre nos envolvendo com sua escrita suave...Amei minha prima!
Maria Lucia Pantoja LimaHá 4 semanas Goiania-Go.A globalidade de ideias de Socorro Guterres só pode ser fruto de muita leitura específica. Ou seja. Quem quer ser poeta, tem uma tendência. Romântica, Progressista, Populista etc. Então, com base no que o coração manda, a poetisa tem que ler muita poesia que fale de sua área. Como o Mhario já disse várias vezes. Só o talento não ajuda a crescer. Mas há aqueles que se acham superpoderosos e só deslisam ladeira abaixo, apesar do talento. Parabéns Socorro. Li teu livro e amei.
Margarida Trinta, professora e poeta paulista premiadaHá 4 semanas Nascida em Peritoró-MAA inacreditável forma do Mhario relatar a essência. Isso ninguém faz com tanta acuidade. Não há dúvidas que o Mhario Lincoln é hoje o analista e resenhista mais "essencial" para a literatura brasileira. O Maranhão tem que reconhecer isso. Porque ninguém se torna mundial, sem falar sobre a sua aldeia.
alcina maria silva azevedoHá 4 semanas Campinas -SPEsses amores prpibidos sempre existiram e existirão. Pedro e Inês, viveram acorrentados pelo poder político e social, trazendo a tragédia da sua amada Inês.
Silvânia TamerHá 4 semanas São LuisMaravilhoso texto. Parabéns querido Mhário, e parabéns para a Socorro Guterres que tão bem representa as mulheres na literatura.
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