Joizacawpy Costa
O que há além dos muros na poética de Jeanderson Mafra? Uma realidade dura desvelada por ele com leveza de poesia, escrever o sofrimento vivenciado pela guerra que ceifa inocentes quer em vidas ou em sonhos, não é tarefa fácil, a dor alheia sentida pelo exercício da empatia e pelo conhecimento histórico das guerras sem sentido.
Mafra traz com maestria e requinte literário uma verdade dura, dolorida, insana, as feridas da guerra que soam em seus versos como grito de quem não tem voz, como a fala do silêncio dos que não podem bradar.
Sair de si mesmo e encontrar com o outro em sua realidade desnuda cheia de dificuldades, é um exercício nada fácil, transpor esse sentimento para o papel é fascinante, mas escrever em poema é extraordinário e Mafra o faz com maestria com a maturidade de quem bebe nas fontes profundas do conhecimento e não se satisfazer com a superfície.
Em sua viagem em busca do outro o autor ver a valentia de um povo em meio às adversidades e mesmo cercados de lágrimas ainda produz a semente gerada com a esperança de não desaparecer como poeira ao vento, mesmo que o cenário lhe seja desfavorável.
Só foi possível transpor o muro porque o autor soube ouvir a voz do ferido relatando a dura realidade da guerra. O muro físico que intitula o poema é conhecido como muro do apartheid em alusão a política separatista que um dia foi realidade na África do Sul.
Para ilustrar seu poema Jeanderson usa a imagem de um artista (Slisman Mansour) que retrata uma mulher com a bandeira da Palestina como quem grita ainda que sem eco o amor pela pátria sofrida.
E foi com a sensibilidade de ouvir e entender o outro, o estrangeiro abrigado em sua pátria que o escritor transpôs o muro da separação entre povos e suas histórias carregadas de significados singularidades específicas.
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ALÉM DO MURO
Quando fitei seus olhos
Vi que além do muro
Miras por toda terra
E cerras junto teu punho
Quando escutei tua voz
Mansa e condescendente
Senti-a toda em aprumo
Em uma guerra silente
E percebi um tesouro
Um choro regando a semente
E dela revia um esboço
De todo um povo valente
É pedra, quando se narra
A história de seu renovo
As lágrimas que dispara
Noutra Intifada estouram
E voam como se águias
Soubessem da presa o apuro
Que hão entre risos e mágoas
Ruir pelo chão o muro
Tomar o azeite e o vinho
Cantar de sua terra o hino
Do Rio ao mar seguro
(Janderson Mafra).
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