EUGES LIMA
Historiador, professor, bibliófilo, palestrante e membro do Centro de Investigação Joaquim Veríssimo Serrão (CIJVS), Portugal.
O dia 19 de novembro deste ano marca os 410 anos de uma das mais importantes batalhas do Brasil colonial que ocorreu no Maranhão e determinou os destinos da parte setentrional do Brasil. Estamos nos referindo a Batalha de Guaxenduba, um episódio único na nossa história, nesses primórdios coloniais. Evento bélico em que nações europeias – franceses e luso-espanhóis - em solo maranhense, disputaram a posse, não só do Maranhão, mas de todo o norte brasileiro.
Mas como começou essa primeira guerra brasílica em terras maranhenses? O Maranhão era ocupado pelos franceses desde 1612, eles estavam fortificados na Ilha Grande do Maranhão, a Upaon-Açu dos Tupinambás. Os portugueses chegaram aqui dois anos depois, em outubro de 1614 e se fortificaram do outro lado da baía de Gauxenduba (Icatu), num forte chamado de Santa Maria. Estavam assim, criadas as condições necessárias para um iminente confronto.
Após os franceses enviarem várias missões de reconhecimento e espionagem ao acampamento português no continente e terem travado algumas escaramuças, conseguido até capturar três navios do lado adversário, La Ravardiére, comandante da França Equinocial, se convenceu que o exercito português estava em completa desvantagem, tanto de suprimentos, como de armamentos e homens e agora com sua frota desfalcada, isso o fez tomar a iniciativa do combate e sair do Forte de Itapari, do outro lado, e ir fazer guerra aos portugueses. A convicção de Daniel de La Touche na vitória era grande.
Então, na manhã do dia 19 de novembro, nas areias das praias do então sítio de Guaxenduba, no continente maranhense, hoje, as praias de Santa Maria, praia da Boca da Lagoa e praia de São Pedro, localizadas no povoado de Santa Maria de Guaxenduba, município de Icatu, Maranhão, franceses e portugueses se enfrentaram numa sangrenta e renhida guerra pela posse do Maranhão.
As forças portuguesas estavam sob o comando do Capitão-Mor Jerônimo de Albuquerque, auxiliado pelo Sargento-Mor do Brasil Diogo de Campos Moreno e o exército francês, sob a liderança geral de Daniel de La Touche, o senhor de la Ravardière, situado a bordo com a metade de seu exército, que não chegou a desembarcar. Em terra, o comando ficou a cargo do nobre De Pézieux. Embora em superioridade numérica e bélica, sendo, portanto, o favorito, mas por erros estratégicos, autoconfiança demasiada; a morte prematura do comandante francês em combate, De Pézieux, além de fatores naturais - a maré vazou, impedindo o reforço das forças que estavam a bordo com La Touche -, os franceses acabaram sendo fragorosamente derrotados de forma surpreendente pelas debilitadas, porém aguerridas forças portuguesas, que se utilizando de um estilo de guerra peculiar ao Brasil colonial, mesclavam estratégias de guerra europeia com indígena, ou seja, adotaram uma estratégia mais eficaz para o momento, sendo decisivo o taque surpresa e fulminante dos portugueses às tropas francesas que ainda estavam descansando do desembarque e tentando se fortificar, quando foram surpreendidas.
Ao contrário dos seus inimigos lusos, os franceses que apesar de contarem com um significativo contingente de mil e quinhentos a dois mil índios tupinambás flecheiros e duzentos soldados, usaram um estilo de combate tipicamente europeu das guerras de Flandres.
Uma das razões da derrota dos franceses na Batalha de Guaxenduba, além das que já destacamos acima, foi porque parte de suas forças, principalmente as que desembarcaram nas praias, não eram formadas por soldados profissionais, mas sim por gente de ofício, ou seja, carpinteiros, ferreiros, enfim, colonos, trabalhadores que vieram colonizar a França Equinocial e fazer a América e que acabaram sendo obrigados a lutarem improvisados de soldados, enfrentando o maltrapilho exército português, porém, mais experimentado no campo de batalha e nessas guerras de sertão.
Nos registros dos depoimentos dos prisioneiros franceses, capturados em Guaxenduba, onde eles relatam suas vidas de simples trabalhadores e contam como vieram parar no Maranhão com suas famílias, eles se queixam de terem sido enganados pelos comandantes franceses que “venderam” para eles um paraíso nos trópicos e quando chegaram aqui, não era nada disso, e ainda tiveram que pegar em armas, sendo muitos massacrados nessa guerra, sofrendo os franceses uma baixa entre 115 a 150 combatentes e 9 prisioneiros dos 200 que desembarcaram, ou seja, uma verdadeira carnificina, fora as centenas de índios tupinambás, aliados dos franceses que também tombaram. Do lado português, os números são: um contingente de 180 soldados, 234 índios flecheiros, sendo 18 feridos e 10 mortos na batalha. Essa guerra, como relata Diogo de Campos Moreno em sua “Jornada do Maranhão”, foi um verdadeiro "inferno na praia", sobretudo para as tropas francesas de La Ravardière que com sua política de já ganhou, acabou sendo terrivelmente surpreendido.
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