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No Dia Nacional da Poesia, uma constatação dura e dolorida: a poesia mudou

Quais os novos estágios em que se encontra a poesia mundial e sua consequência nos livros físicos e na mercadologia poética?

Mhario Lincoln
Por: Mhario Lincoln Fonte: Mhario Lincoln
14/03/2025 às 17h47 Atualizada em 14/03/2025 às 19h23
No Dia Nacional da Poesia, uma constatação dura e dolorida: a poesia mudou
Livro de Ana Cristina César

 O que eu escrevo neste texto, não é com relação ao advento da IA (x) livros. Mas da divulgação massiva das poesias através das redes sociais fato que inverteu o caminho da publicação do livro físico. Antes era o físico que levada à Internet. Hoje é a internet que leva ao livro físico. Essa é a fómula que constato (através de profundas pesquisas), na relação explicada. 

 

Amanheci lendo Ana Cristina César. Sim, decidi começar o Dia Nacional da Poesia indo por um caminho oposto ao da maioria dos analistas e cultuadores poéticos. Cristina César, enorme poeta fora da casinha da mesmice, ainda teve tempo para construir uma aula poética, no remanso de sua maré. E a intitulou de "Primeira Lição":

primeira lição

Os gêneros de poesia são: lírico, satírico, didático,

épico, ligeiro.

O gênero lírico compreende o lirismo.

Lirismo é a tradução de um sentimento subjetivo, sincero

e pessoal.

É a linguagem do coração, do amor.

O lirismo é assim denominado porque em outros tempos os

versos sentimentais eram declamados ao som da lira.

O lirismo pode ser:

a) Elegíaco, quando trata de assuntos tristes, quase sempre

a morte.

b) Bucólico, quando versa sobre assuntos campestres.

c) Erótico, quando versa sobre o amor.

O lirismo elegíaco compreende a elegia, a nênia,

a endecha, o epitáfio e o epicédio.

Elegia é uma poesia que trata de assuntos tristes.

Nênia é uma poesia em homenagem a uma pessoa morta.

Era declamada junto à fogueira onde o cadáver

era incinerado.

Endecha é uma poesia que revela as dores do coração.

Epitafio é um pequeno verso gravado em pedras tumulares.

Epicédio é uma poesia onde o poeta relata a vida de uma

pessoa morta.

 

Mas, antes dessa aula, na página anterior - para um bom entendedor - ela escreveu algo de uma profundidade enorme que alcança o ápice do que ela veio a cometer, anos depois:

"... é sempre mais difícil ancorar um navio no espaço...". (Ana Cristina César).

 

Mutatis Mutandi e com base em Ana Cristina, ratifico meu entendimento de que é a forma poética, a manifestação artística mais intrínseca à humanidade, desde os primórdios das civilizações.

Desta forma, permitam-me enveredar por essa história tão fascinante. A começar pelo "Hino a Inana", composto por Enheduana, sacerdotisa suméria do século XXIII aC, é frequentemente citado como um dos primeiros poemas registrados, destacando-se pela sua profundidade e devoção à deusa Inana.

Além de Enheduana, figuras como Homero, autor das épicas "Ilíada" e "Odisseia", e Hesíodo, com sua "Teogonia", ambos do século VIII aC, são considerados pilares da poesia ocidental. Isso porque, durante séculos, a poesia exerceu influência central nas sociedades, operando como veículo de transmissão de histórias, valores e emoções.

Bom, em meu tradicional bestunto, acredito que a partir de meados do século XX, a poesia era uma das principais formas de expressão literária, moldando culturas e pensamentos. Contudo, com o advento de novas formas de comunicação e entretenimento, como o cinema e a prosa contemporânea, a nossa eminentíssima poesia, gradualmente, veio perdendo espaço no mainstream literário, e evoluindo robustamente digital, como nos “Transformers”, embora nunca tenha deixado de ser uma forma de arte essencial e clássica.

O que prova isso, são as poetas do novo Século: Rupi Kaur, conhecido por sua poesia instigante e acessível, e Warsan Shire, cuja obra aborda temas de identidade e migração, ganham destaque.

No Brasil, nomes como Carlos Drummond de Andrade e Gregório de Matos permaneceram influentes e comemorados por suas contribuições à literatura nacional, não pela tradição e pela maior venda de livros físicos desses poetas, mas pelo enxame de publicações que inundam diariamente as redes sociais, proporcionando às novas gerações conhecerem essas grandes criações líricas e, consequentemente, comprarem seus livros físicos.

Por outro lado, a disseminação da poesia pelas redes acrescentou muito na educação. Desta forma, a poesia continua sendo uma ferramenta didática e digital poderosa, facilitando o desenvolvimento da linguagem, criatividade e pensamento crítico. Como o advento dos compartilhamentos, houve, sem dúvida, algo milagroso: muita gente tem usado a poesia como fator de autoajuda e orientação pessoal, oferecendo conforto, reflexão e conexão emocional. Isso não seria possível – para abarcar um monte de internautas – não fosse as redes. Concorda?

Um exemplo notável é um dos poemas impactantes de Emily Dickinson, já acessados por milhões de internautas no Mundo inteiro - aquele que mesmo escrito, desenhado, embutido, marcado em brasa, leva a pensar, refletir, mudar, indagar, esmurrar e acalmar milhares de leitores. Vide a beleza intrínseca:

 

"Uma palavra morre

Quando falada

Alguém dizia.

Eu digo que ela nasce

Exatamente

Nesse dia".

 

Sensacional eu ter tido acesso através das facilidades da internet, a essas pérolas da poesia, como "Os Lusíadas", de Luís de Camões, a mais traduzida poesia dos últimos anos, narrando as aventuras de Vasco da Gama e celebrando a era dos descobrimentos portugueses.  Ou a (difícil de ler, meio enjoativa, mas importantíssima para o lume), "Ilíada" e "Odisseia", atribuídas a Homero. Ambas são consideradas fundamentais na literatura mundial e transformadas em campeãs de leitura através da livre publicação nas redes sociais, atingindo milhões de pessoas.

Mas, eu tomo o cajado da literatura de minha terra e acrescento nessa curtíssima lista, "I-Juca Pirama" (pronuncia-se Piramá), de nosso inesquecível Gonçalves Dias. Foi o primeiro épico que li e me apaixonei de forma tamanha que tentei dar ao meu primogênito o nome (Piramá), ideia que me forçaram a abandonar. (Snifff).

Tudo lindo e maravilhoso até aqui. Porém, quando se entra na história da "sobrevivência financeira", e se fala em poesia como fator gerador de subsídios monetários de sobrevivência individual ou coletiva, o assunto toma outro rumo. Falo, agora, do tal do Mercado Editorial. Logo me vem à cabeça os desafios comerciais, o bicho-papão desse nicho. Será mesmo a venda do livro físico nas prateleiras das livrarias físicas, um empecilho para tornar o poeta conhecido?

Discussões sobem e descem diariamente pelos corredores das notícias e dos boatos. Mas há quem afirme que "ter seu livro pendurado em uma prateleira em uma livraria é algo para lavar o ego. Pura vaidade!", como disse Jerônimo, artista visual maranhense (já falecido), que entrevistei há uns 10 anos - e vou republicar essa entrevista quando oportuno.

Capa

Na época, 2015, acho eu, ele até não poderia estar coberto de razão. Mas, em 2025, acredito que ele acertou. Se não, vejam: há hoje no Mundo, centenas de poetas bem-sucedidos que nunca publicaram um livro físico de poesias, sequer. Mas são cultuados e amados em suas publicações via plataformas digitais que ajudaram a fazer nomes como de Rupi Kaur, uma poeta contemporânea, escritora e artista da palavra falada, indiano-canadense, popularmente conhecida como "Instapoet", pela atenção que ela ganhou online com seus poemas no Instagram. Seu livro de grande sucesso - e você inclusive já pode ter lido é "Outros Jeitos de Usar a Boca", publicado após o grande sucesso dela nas redes. (Veja foto ilustrativa).

Assim, o poeta contemporâneo pode sim alcançar o sucesso sem ver seus livros nas prateleiras das Livrarias Físicas? E, por consequência, ter, lá no fundo, aquele gostinho de vaidade. Por que não? Sim, o poeta contemporâneo pode alcançar o sucesso sem depender das livrarias físicas, utilizando as redes sociais como principal meio de divulgação e construção de público.

Não só Rupi Kaur, mas também Atticus, pseudônimo de um poeta e escritor canadense popular no Instagram, autor de "Gosto dela livre" e Nayyirah Waheed. Esta, escritora e artista que publicou dois livros de poesia e foi descrita como “a poetisa mais famosa do Instagram”. Waheed é reclusa. Não revela muitos detalhes sobre sua vida. Porém, sua poesia é frequentemente compartilhada aos milhares em contas de mídia social.

Como esses exemplos, muitos outros evidenciam que a poesia encontrou um novo espaço na era da internet. "Se a poesia realmente chamar a atenção, explode", como disse Hermann Lopes, assessor analítico de uma empresa de mídia social, no Brasil. E é exatamente por um compartilhamento instantâneo e interatividade com leitores, os poetas conseguem atingir audiências massivas sem a necessidade de editoras tradicionais ou distribuição física.

No entanto, o sucesso nesse meio exige adaptação ao novo formato: versos curtos, impacto emocional direto e uma estética visual atraente. Redes como Instagram, TikTok e "X" tornaram-se plataformas viáveis ​​para poetas que proporcionam "sintetizar sentimentos universais em poucas palavras e criar engajamento digital", diz ainda H. Lopes.

Por essa razão, perguntei a nossa GINAi, a Inteligência Artificial do Facetubes (presume-se que ela saiba, usando-se a hermenêutica), quais os três pontos fundamentais para estourar nas redes publicando poemas de acordo com o citado no parágrafo anterior. A resposta de FACETUBES/GINAi:

Identidade consistente: Construa uma estética (visual e textual) única e reconhecível.

Interação com o público: Responda, pergunte e incentive participação.

Recursos multimídia e parcerias: Vídeos declamando poemas e colaborações com outros criadores para atrair novas audiências.

Essas orientações a GINAi retirou de estudos e da experiência de grandes nomes do marketing digital como Neil Patel e Gary Vaynerchuk - e de relatórios especializados (como o da Social Media Examiner).

Mas, mesmo com a possibilidade de acrescentar ganhos pelo trabalho poéticas pelas redes sociais, o que acontece no Brasil, nesse nicho? A mim me pareceu ser um caminho semelhante, todavia, com desafios adicionais devido à menor valorização do mercado de poesia e à limitação da penetração internacional dos poetas brasileiro, com raras exceções.

Ainda assim, vale aplaudir nomes brasileiros como Bruna Beber. Ela só ganhou fama internacional, inclusive, após integrar-se diretamente às redes sociais dentro dos parâmetros profissionais (e não de forma amadora do fazer por fazer). É dela, por exemplo, "A fila sem fim dos demônios descontentes", que havia sido lançado em 2006, e explodiu após divulgações nas redes.

Outro exemplo é Ryane Leão, poeta e professora que publica seus escritos no canal "Onde Jazz Meu Coração" e recita seus poemas nos Saraus e Slams do Brasil. Foi essa aparição com metodologia e marketing digital que fez com que "Tudo nela brilha e queima" seu primeiro livro físico disparasse.

Então, publicar na internet é, na verdade uma faca de dois gumes e não é mais para nenhum poeta amador que queira se aventurar nessa seara. Ah! A poesia ainda é, neste século XXI, muito polêmica, quando se trata de mercadologia financeira. Sobre isso, fui buscar uma publicação que fiz na Plataforma Nacional do Facetubes (www.facetubes.com.br) em 2020, onde Olinto Simões (já falecido) analisa de forma direta, pessoal e intransferível, o que disse o poeta, pensador, romancista, matemático, dramaturgo e ensaísta Jacques Roubaud, também de forma direta:  

"em pleno século XXI, os jornais mais poderosos do Planeta, através dos aludidos suplementos literários podem passar um ano inteiro sem publicar resenhas de livros inéditos da poesia contemporânea? E as livrarias, que, na maioria, não contam mais com uma seção dedicada a obras desse gênero? "

 Olinto respondeu assim: "Entendo que essa pasmática opinião, prende-se ao fato dele Frances, morar em Paris e viver numa velha Europa que ainda guarda resquícios da cultura milenar. Vivesse ele num país como o Brasil, ou em qualquer outro que tenha a colonização plural como a nossa, com uma infecção de escória multifacetada de todos os países que por aqui passaram, entenderia que depois do pós-guerra, os jornais se dedicaram à cobertura sensacionalista, política e esportiva, deixando de lado todo e qualquer tipo de cultura, com isso, o desinteresse pela leitura se fazia cada dia mais presente. Nosso país tem mais farmácias e templos religiosos que escolas e livrarias.

Bom, diante desse imbróglio, a poesia, Graças a Deus, não morreu — e nem morrerá. Mas eu vou dizer uma coisa que vai doer muito nos conservadores: a poesia não morreu, mas se transformou e vai se adaptando às mudanças do Mundo. Isso porque, em um ambiente digital, a poesia começa a alcançar mais pessoas do que jamais conseguiu no passado. Talvez tenha sido essa mesma ideia, de Johannes Gutenberg quando começou a imprimir a primeira Bíblia, em 1450, sabendo-se que esse foi o primeiro livro impresso em uma prensa de tipos móveis no Ocidente e, assim, poderia alcançar muito mais pessoas ao derredor da sua comunidade.

Hoje, 575 anos depois, o milagre digital torna poetas como Bráulio Bessa, cearense, então, com alguns exemplares impressos, no recitador em vídeos de declamação mais de 250 milhões de visualizações.

Outro, João Doederlein (Akapoeta): escritor que ganhou notoriedade nas redes sociais com o projeto "Ressignificados", onde atribuiu novos sentidos às palavras. Seu perfil no Instagram, @akapoeta, conta com uma base expressiva de seguidores.

Duvido que se alguém que está lendo estas minhas linhas já não tenha ouvido ou visto Fabrício Carpinejar, poeta, cronista e jornalista gaúcho, cuja presença ativa nas redes sociais, onde compartilha suas reflexões e poemas, atinge centenas de milhares de acessos.

Assim, - e sem prateleiras de livrarias físicas lotadas de novos poetas - os livros físicos estão mudando o caminho com a massificação digital: atualmente é a formula digital que ajude diretamente a venda dos livros. E, claro, num caminho inverso ao que acontecia anteriormente.

Para ilustrar, pedi à editoria do Facetubes que me orientassem sobre o funcionamento dessa onda embrionária da publicação/ganhos/acessos/marketing digital.

Eis o que colhi:

“A monetização nas redes sociais varia significativamente conforme a plataforma e o tipo de conteúdo. Abaixo, apresento uma análise detalhada de como o faturamento é calculado em algumas das principais plataformas:

YouTube

No YouTube, os criadores de conteúdo são remunerados principalmente pela exibição de anúncios em seus vídeos. O valor pago é geralmente medido pelo CPM (Custo por Mil), que representa o custo para os anunciantes a cada mil avaliações de anúncios. De acordo com informações disponíveis, o CPM pode variar entre US$ 0,25 e US$ 4,50, dependendo de fatores como o nicho do conteúdo, localização geográfica do público e engajamento do canal. Isso significa que, a cada 1.000 visualizações de anúncios, um criador pode ganhar entre US$ 0,25 e US$ 4,50.

 

Instagram

O Instagram não paga diretamente aos criadores de conteúdo com base no número de visualizações ou seguidores. Em vez disso, a monetização ocorre por meio de parcerias com marcas, marketing de afiliados, venda de produtos e outros métodos. Por exemplo, influenciadores com cerca de 1.000 seguidores podem ganhar "entre US$ 20 e US$ 200 por postagem patrocinada", enquanto aqueles com 10.000 a 50.000 seguidores podem ganhar entre US$ 200 e US$ 1.000 por postagem. Além disso, os programas dinâmicos de bônus para criadores de Reels do Instagram, podem acrescer a renda com pagamentos com base no desempenho de seus vídeos curtos. Por exemplo, um bom "publicador" pode receber de US$ 125 a cada 50.000 visualizações, US$ 250 a cada 100.000 visualizações e assim por diante. Vale dizer que o sr. Bráulio Bessa consegue algo em torno de 250 milhões de visualizações. É só calcular para ver quanto isso pode render em um mês de trabalho bem elaborado, com método e dentro das normas do "marketing digital".

Diante de tudo isso, que fique CLARO: a poesia impressa em livros físicos, jamais morrerá. Mas quem não acompanhar a evolução tecnológica (do saber publicar, não do saber fazer), ficará pelo caminho.

Por favor, deixem as suas opiniões. Reforçará muito meu ponto de vista.

Mhario Lincoln é poeta, jornalista e editor-sênior da Plataforma Nacional do Facetubes (www.facetubes.com.br).

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Ahtange FerreiraHá 1 mês Paço do LumiarÉ sempre um gosto e aprendizado imenso passar por este canal.
Socorro Guterres Há 1 mês Natal/ RNExcelentes e atualíssimos ensinamentos. Aula!
Silvânia TamerHá 1 mês São LuisParabéns amigo Mhario pelo excelente texto. Abraços com muitas saudades de vocês.
José NinaHá 1 mês São Luís do MAOra Vivas, Mhario. Nunca 'imaghinei' que você estivesse nesse estágio com 70 anos. É surpresa? Não. Sei que vc estuda demais. Eis ai o resultado. Rarara.
EDOMIR MARTINS DE OLIVEIRAHá 1 mês São LuísCaríssimo Editor e Autor deste lindo texto. A consistência é uma realidade Que aula Mhario Lincoln! A APB fica orgulhosa pelo seu comportamento profissional e o Maranhao fica lhe devendo mais esta aula de sabedoria. Quando os poetas redescobrirem a poesia rimada e os resultados de metrificacao com certeza os leitores sentirão mais beleza em todas elas. Parabéns.
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