Susana me ensinou a compreender uma tela
(*) Mhario Lincoln
Até então, em minhas atividades de colunista diário, divulgador das emoções da sociedade maranhense, pouco havia me preocupado com as artes visuais. Olhava, mas não prestava a atenção necessária que um formador de opinião pública deveria prestar ao se deparar com a arte figurativa (ou não). Foi a artista Susana Pinheiro, no embrião de sua carreira de sucesso, que me levou a fazer a primeira grande reportagem sobre artes visuais. Eu, atraído pela forte personalidade daquela jovem pintora, influenciando diretamente a construção de sua arte.
Quadros de Susana Pinheiro.
Conheci Susana Pinheiro num período bem interessante de sua vida: a pós-adolescencia. Contudo, com uma força tremenda e uma consciência artística imensurável. Quando vi suas primeiras telas as admirei pois sabia que ela teria um futuro brilhante, abraçando a arte das tintas.
Não deu outra. Quase 20 anos se passaram e eu reencontro aquela menina que havia me maravilhado na época muito mais por sua potência emergente e sua indiscutível inteligência, do que como artista-visual propriamente dito.
Hoje, as coisas se inverteram, apesar de sua personalidade ter adquirido ainda mais nuances de maturidade invejável. Claro que isso a ajudou a praticar sua arte de forma igualmente madura e consistente. Passei algumas horas tentando penetrar em cada traço e em cada tom do trabalho de Susana. As cores foram as primeiras a me chamarem a atenção: suavidade impecável.
Quase cores de interminável saudade. Acertei! Então, quando ela esteve em São Luís, encontrei-me com ela na AMEI - Associação Maranhense de Escritores Independentes e rapidamente pude notar o quão suave e terna é hoje, sua expressão artística.
Naquela fase, Susana mostrou muito de poético. Muito de sentimental. Muito de coração e saudade. Ela me contou ao telefone, depois, que sua inspiração veio da saudade mesmo, de sentimentos mesmo, isto é, a mãe dela faleceu e era exímia tecelã. Revirando as coisas da mãe deu-se com varandas – as que embelezam as redes de algodão – muito comuns no nordeste brasileiro. Um trabalho artesanal de belíssimo acabamento que, ao depois, serviu de base para a construção das telas de Susana Pinheiro, mostradas em ampla exposição na cidade de São Luís-Ma, em passado recente.
Não são apenas telas. São pedaços de saudade, sem dúvida. Assim vi e vejo este trabalho, esta construção sentimental ornamentada de cores tão suaves que nos fazem viajar na sensibilidade da pintora, em cada textura ali produzida. Confesso que fiquei encantado com o trabalho. A mim me cabe dizer que gosto demais de Susana Pinheiro. Tanto que na época, ainda colunista de jornais ludovicenses, concedi-lhe página inteira para mostrar o começo – do começo – desta maranhense, hoje, residindo no Rio de Janeiro e com uma carreira de grande sucesso.
Sinto-me feliz. Mais que isso. Sinto-me o primeiro a divulgar o embrião que tornaria a arte de Susana Pinheiro um conglomerado de sentimento, talento e persistência, transformando (nessa exposição) as rendas das varandas meticulosamente tecidas pela mãe, em telas que choram saudades, mas vertem, igualmente, choro de felicidade por ter a artista conseguido essa simbiose entre o belo e o coração.
Parabéns. Saiba que lhe gosto muito.
São Luís, 2018.
*Mhario Lincoln é presidente da Academia Poética Brasileira
EM TEMPO:
Perguntei ao crítico de arte e designer, modista e artista visual premiado, João Ewerton, da Academia Poética Brasileira, opinião sobre o trabalho de Susana Pinheiro. Ele gentilmente respondeu: Eu gostei muito. É um estilo contemporâneo, com técnica mista, que vai desde o figurativo até o abstrato, conjugando formas geométricas com formas orgânicas, criando uma composição dinâmica muito bem resolvida, onde muitas vezes o geométrico da renda se transforma em figurativo pela referência com a renda em si, mas, na verdade, são os geométricos que remetem a uma leitura diferente, o que torna uma pintura singular no mercado, especialmente, pelo seu dinamismo. Ou seja, Susana Pinheiro dá personalidade a sua arte muito bem resolvida e idealizada.
Um pouco da Poesia de Susana Pinheiro:
Canto residente
*Susana Pinheiro
Os cantos da minha terra
São encantos de magia
Nos becos da aldeia
Reside amor e alegria
Nós cantos da minha Ilha
Sou um pouco de cada tribo
Guajajara, Apurinã, Tucano e até Baniwa
De tudo se herdou e Heengatu foi devolvida
Nos cantos da minha terra
Curumim sabe entoar cânticos sagrados e Nhanderu exaltar
No canto do meu povo o clamor em sobreviver
Cada traço tem sua cor
Piranga, Una e Ajubá
Vamos todos unidos
a resistência cantar
*SUSANA PINHEIRO é membro da Academia Poética Brasileira, seccional Rio/RJ
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Poesia sobre o "Tecer de Varandas", de Susana Pinheiro.
Varandas de Redes e Saudades
Mhario Lincoln
A rede embala,
igual nos braços
de minha mãe.
A dor cala!
E durmo no sonho de
um dia ser um rei.
Na rede, o adulto some
no ventre de antanho.
Durmo como estranho.
E, enquanto a rede
fala e embala, vejo
no tecer de varandas,
os desenhos que
nunca completei.
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Vídeo-Bônus
Produção: VídeosTV do Facetubes (www.facetubes.com.br). Participação especial: poeta e atriz Carmen Regina Dias (Cascavel PR) e da artista visual Susana Pinheiro, Rio/Rio. Telas: Exposição "Tecendo Varandas". Editadoem São Luís-Ma: 15.01.2022
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