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"A POESIA CONTIDA NA SEXUALIDADE DA PESSOA COM DEFICÊNCIA", por Sharlene Serra

Publicação autorizada pela autora. (Público Adulto).

14/08/2024 às 07h28 Atualizada em 14/08/2024 às 09h06
Por: Mhario Lincoln Fonte: Sharlene Serra
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Leninha
Leninha

Esta matéria deve ser lida pelo público adulto

 

NOTA DO EDITOR: Esta matéria publicada no comecinho de 2022, traz um tema muito especial. A palestrante, poeta e escritora, SHARLENE SERRA especializada em inclusão social, fez essa emocionante homenagem a Leninha, uma cadeirante-artista, falecida dia 20 de agosto de 2021. Sem dúvida, uma página que deve ficar na história. Por isso, a republicamos hoje. A matéria contém mais de 1.140 acessos e 41 comentários. Parabéns, confreira APB. (Mhario Lincoln).

 

Hoje amanheci lembrando de uma amiga muito amada: Leninha Acessibilidade como todos a conheciam, ela não gostava de dizer seu nome e por respeito não o colocarei aqui.

Uma mulher que ousou, sabia da sua inteligência, beleza, do seu encanto, de um sorriso que iluminava, acreditava no amor, no desejo, era apaixonante e muito intensa em tudo que fazia. Aos 19 anos em um acidente de carro perdeu seu amor e a lesão medular a tornou uma mulher com deficiência. Paraplégica, lutava incessantemente pela inclusão, acessibilidade, respeito e a sua voz ecoava forte em tudo que acreditava. A deficiência nunca tirou o sorriso e a sensualidade, que era sua marca registrada.

Eu e Leninha nutríamos uma amizade pela conexão da inclusão, ela conhecia meu trabalho na literatura inclusiva e eu sua luta por inclusão, existia então, uma admiração recíproca, conversávamos sobre tudo e o tema sexualidade da pessoa com deficiência foi surgindo, pois era um um assunto que ao mesmo tempo que fazia os olhos de Leninha brilharem a preocupava, mediante a falta de informação que existia, mas ela transitava nele com naturalidade, ignorando os tabus que a sociedade nutria.

- Sharlene precisamos escrever sobre a sexualidade, pois muitas pessoas acham que  o sexo não existe para as pessoas com deficiência. dizia Leninha.

Sharlene e Leninha.

Homens e mulheres com deficiência se fecham para o amor por acharem que o sexo fora do patrão " sem movimentação "causa estranheza. Precisamos entender que o casal deve buscar novos caminhos, novos jeitos de desfrutar da companhia um do outro. Na tetraplegia por exemplo (lesão medular do pescoço para baixo), precisamos entender o sexo de forma subjetiva. A sociedade estabelece padrões, mas o padrão deve ser estabelecido pelo casal. É importante lembrar ainda que a ausência ou amputação de membros, assim como deficiência visual, auditiva ou outras deficiências, não impedem homens e mulheres de vivenciarem uma vida sexual mediante a sua condição, quando entendem que tem direito à sexualidade e que tem necessidade sexual como qualquer pessoa, que não é feio querer ser tocado, beijado, acariciado, amado, seu comportamento e atitudes mudam e a parte erótica flui com mais naturalidade. No entanto, não há como isso acontecer se a pessoa com deficiência não se depreende dos seus próprios receios ou a sociedade não respeita sua condição na liberdade da própria intimidade. E Leninha se libertava, era essa mulher que voava em sua cadeira de rodas, repleta de desejos, de aceitação, acreditava no seu potencial de sedução e se permitia amar e ser amada.

Diante as nossas conversas, nasceram alguns poemas que na tentativa de fazer surpresa, o tempo nos mostra que a vida é agora, Leninha nãos chegou a ler, faleceu no dia 20 de agosto de 2021, mas plantou a semente para que muitos sentissem prazer ao ler cada poema de exaltação ao amor e respeito a condição do outro.

  Dedico cada poema a todas as pessoas com deficiência em especial a minha amiga Leninha, pela força feminina, pelo sorriso que mesmo em dias tristes, nunca deixou de sorrir. Leninha partiu mas em cada pessoa que conheceu, permanece a  continuidade da sua luta.

 

MULHER ACROBATA

Mulher com todas
as letras e sensações
dança lutas, 
lágrimas, 
partos, 
vidas.

Não a negue 
o direito
de ser, viver!
não a discrimina

A deficiência é 
um detalhe,
o teu olhar, 
a torna invisível e
a mata.

Mas a mulher tem
desejos  latentes
na veia percorre
uma loba de
alma
acrobata.

+++++++++

CHAMAS NO GIRO

Rodas

rodeiam

rodopiam

giram

giram

movimento

emoção

Passos em

liberdade

visto como

prisão.

 

Sensualidade e

sexualidade

Gira em rotação

Mulher com

deficiência

exala sedução.

 

Enlaço de

rodas- pernas

Entregue o prazer

no desejo em

abundância 

o movimento  do giro

na sensualidade                 

da chama. 

++++++++

(Sharlene Serra) 

PRAZER FORA DOS PADRÕES 

Entre pernas

mãos, silêncios

ou rodas 

prazer

Libido

força

desejo

*oda

 

Fluidos que se trocam

Intimidade prazerosa

Da vontade do querer

Poesia vira prosa

 

No toque da pele

Do bem querer

Suspiros desejos

nos pontos A, B, C, G

 

A nudez da alma

Liberdade do corpo

cumplicidade

a sensatez do desequilíbrio

acessibilidade x intimidade

O desejo dita regra

Beijo, línguas em reciprocidade

 

O prazer

presente divino

àpice que leva ao infinito

 

Não existe padrão

a liberdade dita a regra

o amor direciona

 ao prazer que ele

mesmo gera

(Sharlene Serra)

++++++

ORGASMO NEURAL

O prazer visto e revisto  na

presença.

No olhar sem visão,

enxergar com o toque,

corpo no movimento imóvel

no sussurro dito com as

mãos.

Inclusão do poema em excitante conexão.

 

Poemas da pele,

da intimidade do

 corpo sem movimento,

do instante e

o beijo como alimento.

 

O fetiche  da  liberdade sensorial,

o desejo incontrolável 

do possuir e apenas

no imaginar

sentir orgasmo neural. 

(Sharlene Serra)

++++++++

MÚLTIPLOS  PRAZERES

A sensualidade e a sexualidade

preconceito latente

como se a deficiência

eliminasse o desejo  presente.

 

A deficiência  constrói e reconstrói,

o cérebro vira  um órgão sexual, 

identifica o  excitante, atraente,

gerando prazer neural.

 

A percepção do prazer

Cérebro    acionado

na congruência do ato.

Braços, pernas amputado

envolvendo   todos os

sentidos: visão, audição, paladar e tato.

(Sharlene Serra)

______________________

Sharlene Serra – de São Luís Maranhão, poeta, escritora. Graduada em desenho industrial, pedagogia e especialista em Ed. inclusiva. Participa de diversas antologias/coletâneas nacionais.  Membro da Academia Poética Brasileira , vice presidente da AJEB- Associação de jornalista e escritoras do Brasil, coordenadoria do Maranhão e de outras associações literárias.

 

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antonio reis noronhaHá 2 meses uberabaUm assunto, considerado tabu, ou pelo menos relegado pelos demais e acabrunhado pelo próprio deficiente, por vergonha ou mêdo da rejeição e quando abordado às pessoas sós, a coisa se torna mais dramática e encapsulada. Uma vez mais, a nossa querida Escritora Sharlene Serra, desbrava os mistérios humanos.
Alfredo ManfredinniHá 2 meses São PauloQue mulher é essa minha gente?! Escritora que desbrava e nos emociona. A Leninha com certeza está feliz, pois imagino o quanto ela queria propagar essa força vital. E quem falar que sexualidade é um assunto secundário, não entende de nada e deve nem saber sobre a diversidade do prazer e que existe o neural. Amei e senti na pele todos os poemas. Você Sharlene Serra é maravilhosa.
Paulo Roberto Barbosa Há 2 meses São Luís, Maranhão Sou uma pessoa com deficiência. Muitos acreditam que cadeirantes não consigam transar ou sentir prazer na hora do sexo, mas o autoconhecimento, a segurança e a adaptação ao próprio corpo permitem o prazer precisamos conhecer nosso corpo depois da lesão medular, que sexo não esteja focado apenas nos genitais.
alcina maria silva azevedoHá 2 meses Campinas- SPQue texto maravilhoso! Sharlene, vc é sensacional! Exaltou a sexualidade em pessoas deficientes, mostrando que elas tem seus sentidos muito mais apurados do que os não deficientes. Sentem com o cérebro e emanam essa energia para todo o corpo.
FernandoHá 2 meses PortugalTodo mundo diz que é normal a sexualidade mas na prática, todos se chocam ao ver um cadeirante casado, já imaginam que ele será traído. Se olham uma mulher com deficiência com seu esposo, santificar ele. Sharlene tua voz me representa. Tua poesia me faz acreditar em um mundo liberto. Sou cadeirante e por muito tempo vivi entalado com isso. Parabéns. Estou encantado.
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