Edmilson Sanches
LIBERDADE --- PALAVRA E PODER
Liberdade não tem preço -- mas tem data: 1338. Foi aí, nessa primeira terça parte do século 14, que se registrou em Língua Portuguesa a palavra “liberdade”. A virtude está no meio: um século antes havia surgido a palavra “igualdade”; um século depois, a palavra “fraternidade”. Assim, pois, a datação do primeiro registro, em Português, dos termos que, (re)unidos, acabariam por se tornar, em Francês, verdadeira trindade e lema revolucionário desde 1791 -- Liberté, égalité, fraternité.
O que veio primeiro: o conceito ou o direito? O linguístico, semântico, filológico, ou o jurídico, legal, fenomenológico? A liberdade e a igualdade foram primeiro percebidas como desejo ou vontade, como ação ou atitude ou como direito e virtude?
O certo é que os seres humanos só podem ter completo seu sentido de autorrealização se a liberdade for, mais que uma vontade, uma realidade, um exercício cotidiano com o qual ou por meio do qual se poderão realizar (ou se lutará para isso) todas as demais vontades, no limite do direito dos outros.
É nesse rumo e com esse prumo que escreveu o jornalista, escritor e ativista social e educacional Gilberto Dimenstein: “Lutou-se pela ideia de que todos os homens merecem a liberdade e de que todos são iguais diante da lei”. (Neste maio de 2024 completaram-se quatro anos de falecimento de Dimenstein, a quem conheci e de quem tenho, entre outros, o livro Meninas da Noite, autografado e com dedicatória: “Para você, testemunha ocular”. Gilberto referia-se ao fato -- de que ele tomou conhecimento -- de eu ter feito reportagem sobre a exploração sexual de adolescentes no interior do Maranhão, quando eu era diretor da sucursal do diário “O Imparcial”, jornal do conglomerado “Diários Associados”).
No dizer de Corneille: “A liberdade não é nada quando todo mundo é livre”. Liberdade... Que capacidade ou condição é essa cuja sensação ou sentimento, sentido ou significado em tê-la mais se manifesta quanto mais não se a tem?
Se liberdade é como o ar que se respira, qual foi a última vez que valorizamos realmente o ar, o inspiramos calma e profundamente, o sentimos em nossos pulmões e a ele agradecemos por nos oxigenar a vida?
Em nome da liberdade, quanto mais a Humanidade lutará, matará, morrerá?
Em nome da liberdade, quanto mais (in)certos Poderes mentirão, subverterão, censurarão, caçarão e cassarão, prenderão?
Em nome da liberdade, quantas palavras terão de ser ditas, quantas haverão de ser caladas, quantas talvez sejam escritas, quantas apenas pensadas?
Em nome da liberdade, quantos livros ainda se publicarão, quantos terão lugar na prateleira, quantos se proibirão, quantos se lançarão à fogueira?
Negar a liberdade é não merecer sequer a liberdade de negá-la.
Muito da liberdade é o seu poder. Muito em seu poder é o poder de falar o que pensa, dizer o que sente, escrever o que elaborou. Liberdade é palavra. E, como reconhece a Bíblia, “a morte e a vida estão no poder da língua”, no poder das palavras -- pois palavras têm poder.
E o poder da palavra é maior do que a palavra do Poder.
Superior ao poder da palavra, só a liberdade de poder dizê-la.
“Liberdade! Liberdade! Abre as asas sobre nós!”