Por: Keila Marta (*) imortal – APB, Crítica de arte e analista literária, graduada em Pedagogia - UNOPAR e Letras Língua Portuguesa - UEMASUL
Quando se pensa na existência, a palavra tempo com os diferentes marcadores ganha destaque, seja por meio das representações concretas ou abstratas. É nas entrelinhas, com as questões mais complexas que essa temática ganha corpo, em mais uma "Coerência das Incoerências" do pensador contemporâneo Olinto Simões.
Após situar o leitor sobre o contexto do tema discorrido, no segundo parágrafo tem-se a descrição do nascer dessas reflexões:
Minha consciência, me apresentava situações esdrúxulas de comportamento humano durante toda a história da humanidade. E flagrado na conduta, mas flagrando as estapafúrdias condições vivenciadas nos meus 63 anos, afundei meus pensamentos nas incoerências.
Se, em "Coerência das Incoerências I"¹ Olinto dialoga com Cecília Meireles, e demonstra que a literatura caminha numa linha atemporal, em "Coerência das Incoerências II", põe em questionamento as incongruências que envolvem o tempo.
Em dois dias, será na complexidade do tempo, algo que foi nominado como 'Ano Novo'. Cabem aqui, no entanto, algumas perguntas:
- Mas que raio de ano novo é esse?
- Alguém pode me dizer quando foi que o tempo começou?
- E se começou, quem estava lá, atemporal para registrar o começo?
Nesse sentido, o autor em questão exemplifica algumas variáveis que têm ocorrido com o tempo no mundo tridimensional. É o chamado Chronos, que na Mitologia Grega, ganha forma na velha figura do deus do tempo, filho de Urano e Gaia, simboliza a linearidade, o tempo físico. E, utilizando dessa referência o homem pode viver num tempo organizado para melhor proveito social, contado em ano, meses, dias, horas, minutos e segundos.
Seguindo a literatura mítica, é apresentada no Livro do Gênesis a criação do universo e a revelação dos sinais que expressam a ideia tempo.
“Deus disse: Que exista Luz! E a Luz começou a existir. Deus viu que a Luz era boa. E Deus separou a Luz das trevas: à Luz Deus chamou dia, e às trevas chamou noite. Houve uma tarde e uma manhã: foi o primeiro dia”. (GÊNESIS, 1, 3-5)
Mas, a grande inquietação do pensador é que essa cronologia não começa do dia 0 do ano 0 antes de Cristo e tampouco o primeiro dia de cada ano necessariamente começa no primeiro dia da semana, e para deixar a situação mais perturbadora não existem registros oficiais do primeiro homem e da primeira mulher, os achados geológicos e arqueológicos, direcionam para uma sequência de anos cheia de lacunas que o tempo talvez não quisesse revelar. Afinal de contas segue-se um calendário meio ilógico, marcado por muitas mudanças. E eis a questão, qual calendário serviu de referência para o atual? Segue a resposta.
Vigia até então, o 'Calendário Juliano', criado pelo 'Imperador Romano Julius Cesare", 46 anos antes do nascimento de Jesus. Tal calendário marcava a duração de 'Um Ano' com apenas 10 meses, tanto que, 'Dez-embro' quer dizer, etimologicamente, '10º Do Ano', e atualmente, tem o número 12; como 'Nov-Embro' o 9º, tem o número 11, e assim por diante em ordem regressiva até 'Set-Embro', o 7º, que tem o número 9; tudo isso, numa época contada ainda por outro calendário.
Em seguida, são apresentadas possíveis soluções, com alguns cálculos de adição e subtração, numa situação compensatória que melhor se aplicaria a transição, de um calendário de 10 para o de 12 meses.
Após tantas problematizações para se chegar a uma resposta aproximada da contagem quase fidedigna ao real número de anos que o Planeta Terra possui, eis que surgem alguns questionamentos, possivelmente, não para obter respostas acabadas, mas para o leitor construir novas perguntas ou talvez encontrar outras soluções e novas respostas.
É. Quando dizem que vamos passar de ano, as pessoas comuns começam a imaginar coisas, justamente aquelas coisas comuns..., 'O Que Mudar No Ano Novo'; e ainda, promessas mais comprometedoras, 'Ano Novo, Vida Nova'; como se isso fosse possível...,
Vamos passar para onde?
Quando?
Em que tempo?
Quem souber a resposta que me a dê.
No último parágrafo, ao mostrar posicionamento faz um comparativo dele, pessoa, com um ponteiro. Por meio de uma analogia
Olinto Simões reforça a ideia central do texto, permitindo o leitor, a se repensar como coabitante do tempo:
"...eu me declaro perdido no tempo, como um ponteiro de segundos que se soltou e caiu junto ao vidro do mostrador dum relógio. Os grandes apontadores, presos ao eixo que imaginariamente os mantêm concêntricos, seguem marcando os tempos maiores, minutos e horas, mas aquele que os informa das frações passadas, está inerte.
Permanece na base, solto, junto à transparência do vidro, mas, é como se revoltado..., se tivesse soltado e apreciasse o absurdo espetáculo do universo minimalizado..., das incontáveis voltas e mais voltas dadas pelos outros ponteiros, sem saírem do lugar.
Portanto, entre diferentes assertivas em "Coerência das Incoerências II", o cronista convida o interlocutor a sair da caixa, nem que seja necessário se desprender como o ponteiro revoltado, para então pensar outras possibilidades.
E é assim que se faz Filosofia, dando corda, trazendo à luz temas que comumente pouco se questiona, pois, sem se perceber, a sociedade foi sendo formatada a pensar como certos idealizadores queriam.
Nota
¹ Textos e análise publicados na Revista Acervum em 23 de junho de 2018. Disponível em: https://www.acervum.com.br/texto-de-keila-marta.
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Referências
A BÍBLIA. Origem do mundo e da humanidade. Tradução de Ivo Storniolo e Euclides Martins Balancin. São Paulo: 2008. Velho e Novo Testamento. Disponível em: https://biblia.paulus.com.br/biblia-pastoral/antigo-testamento/pentateuco/genesis/1
SIMÕES, Olinto. Coerência das Incoerências II, Prazer Literário: Curitiba, 2008. Disponível em: http://prazerliterario.blogspot.com/2008/12/coerncia-das-incoerncias-ii.html.
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