*Mhario Lincoln
Decidi começar o ano lendo algo mais profundo. Saí às ruas, à procura de algo diferente, de uma leitura mais vigorosa. Então, depois de algum tempo mergulhado na solidão de uma pequena livraria, no centro de Curitiba, (ruas quase vazias e com ventos frios), descobri em uma prateleira (Seção de Sociologia), lá no fundo, o livro "A Criação da Consciência Feminista", de Gerda Lerner. Não conhecia a autora, nem Lola Aronovich, a prefaciadora da obra.
Abri, olhei, senti o cheiro da celulose e da tinta; e logo me apaixonei em minha primeira passada d'olhos em torno de meia hora de folheio. Fiquei inclusive irrequieto, uma parte lendo em pé, outra sentado num banquinho, na esquina do paraíso - ao lado da prateleira dos grandes mestres da Filosofia mundial. Mas vale afirma que ao abrir esse livro (profundo e envolvente), ficou impossível não sentir, em primeiro lugar, a potência literária e de conhecimento pessoal de Lola Aronovich e, ao depois, a força da pesquisa de Gerda Lerner, quando se propõe a escrever sobre os mais de 1.200 anos de luta das Mulheres para se libertarem suas mentes do pensamento patriarcal.
Minha admiração pelo livro só aumentava. Especialmente quando li: “Neste livro erudito e maravilhoso, Gerda Lerner segue os passos de suas antepassadas acadêmicas, mas com uma diferença pungente: por meio de sua indignação legítima, Lerner remedia a tragédia própria que analisa. Todos que estudam o pensamento das mulheres deveriam ler este livro, descobrir nossa herança e contemplar suas interrupções.” Escreveu Nell Paiter, historiadora emérita da Universidade of American History. (Princeton).
Vale repetir: há mais de 1.200 anos, as mulheres vêm se esforçando para libertar suas mentes do pensamento patriarcal. É justamente essa longa jornada que Gerda Lerner torna visível, transformando em palavras (e que palavras) a luta e a esperança de tantas gerações que lutaram (e ainda lutam) por autonomia.
Acabei destacando igualmente, a análise de Robin Morgan, poetisa e ativista: “Lerner se mostrou pioneira no estudo da História das Mulheres e, após tantos anos, livros estes permanecem proeminentes em seu campo de estudo. Gerda Lerner conseguiu novamente! Este trabalho extraordinário é o antídoto perfeito para quem ainda acredita que o feminismo é um fenômeno recente. Mais uma vez, Lerner dá às mulheres o protagonismo da história.”
Saí, ao depois, da livraria com uma sensação de quem “já ganhou o ano”. E nem bem cheguei em casa, comecei a devorar o livro. Até aqui, (02.01.2025, às 13:03), quando escrevo este texto, fui convidado a vivenciar a tragédia e o triunfo da condição feminina — esse misto de dor e conquista que atravessou séculos. Desta forma, não há como sair dessa leitura, depois de descobrir, com a ajuda de Lerner, a herança feminista que tantas vezes foi silenciada.
E, como aponta análise da prefaciadora, “esta obra terá uma influência de rigor e talvez seja a mais significativa de Gerda Lerner.” Paguei para ver e estou simplesmente aprendendo a falar e escrever sobre esse polêmico assunto, de forma real, acadêmica, sensibilizado com tudo que até agora absorvi. Imagina o bem que essa leitura me trará ao final, lá pela página 477. Evoé, Lerner!