*Mhario Lincoln (Leia mais no www.facetubes.com.br)
A professora Lucia Helena Galvão afirma, nesse recorte do Instagram (abaixo) que "a vida não é aleatória… Ela tem uma lógica, uma inteligência que nos orienta a cada passo. Por exemplo: se você é impaciente, provavelmente atrairá situações e pessoas que ajudarão a lapidar essa impaciência, promovendo seu crescimento". E complementa, ao final com uma frase que me instigou a escrever esse texto.
Ela disse:
"Por que que eu sei? Porque li a vida..."
Fui pesquisar sobre “... porque li a vida” e entendi o quão importante é essa frase. Mesmo porque, há algo de profundamente arquetípico que evoca a pesquisa simbólica da psique, tão cara a Carl Gustav Jung.
Quando Jung se propôs a compreender o ser humano em sua totalidade – incluindo seus sonhos, mitos e símbolos universais –, trouxe à tona a ideia de que o conhecimento genuíno está entranhado numa experiência direta com a realidade e com o inconsciente coletivo. Nesse sentido, “ler a vida” é como se lançar às profundidades interiores (abissais) e emergir em meio às revelações que, sem querer, acabamos compartilhando no dia a dia, nas redes sociais, nos encontros, nos bares.
Na minha pesquisa fui ao encontro dos maravilhosos gregos antigos. Eles ensinaram um princípio muito conhecido. Do “conhece-te a ti mesmo”, inscrito no oráculo de Delfos e reafirmado por Sócrates. Esse convite ao autoconhecimento ilustra a mesma busca anunciada por Jung para que a consciência das camadas mais profundas da psique individual, seja explicitado.
Reaprendi (cm certeza), lendo e pesquisando sobre o tema, que historicamente, no século XX, a ideia de “ler a vida” ganhou novos contornos com pensadores existencialistas, como Jean-Paul Sartre e Martin Heidegger. (Impossível não lê-los). Para eles, o ato de existir é, em si mesmo, uma leitura contínua do mundo, onde o homem não apenas observa, mas vive e transforma a si próprio.
Sob essa perspectiva, a frase “Por que eu sei? Porque li a vida...” ganha adendos ainda mais profundos quando é entendido que o saber não pode ser meramente teórico ou abstrato. É preciso atuar na existência, interpretar seu enredo e, por conseguinte, participar de sua elaboração enquanto personagem e autor simultaneamente. Daí, volto a tocar na mesma tecla: por que eu sei? Porque "li a vida". Ou seja, cada livro, cada poema, cada aventura que se lê, (sejam até mesmo depoimentos em divãs), abrem os portões da criatividade, misturada ao dom de cada um. Essa é a regra! Se não assim, vira figuração.
Por outro lado, pensar nessa frase como crítica de filosofia e arte desperta reflexões sobre o papel do artista e do pensador. A criação artística, como uma “leitura” sensível da vida, traduz pulsões profundas em formas estéticas, enquanto a filosofia, por sua vez, tenta verbalizar esse mistério em conceitos, categorias e proposições lógicas. Contudo, há uma intersecção sutil: na essência, ambos estão comprometidos com a urgência de compreender o que é viver, na plenitude do nosso espírito e da nossa condição humana.
Assim, a mensagem de Lúcia Helena Galvão – “Por que eu sei? Porque li a vida...”, que me tocou profundamente quando a ouvi, transpõe a própria história do pensamento ocidental, quando me sento na mesma mesa com Sócrates, Platão, Aristóteles, Jung e Sartre. Ela nos lembra que o conhecimento profundo não floresce de meras abstrações, mas brota da seiva da experiência vívida, do contato reverente e curioso com o mundo e com a própria alma.
Destarte, esse saber, embora pessoal e intransferível, acaba se convertendo em uma ponte entre os indivíduos, pois ao compartilhar leituras da vida, se reforça, queira o autossuficiente ou não queira, a compreensão mútua e a renovação do humano. Sempre vou por esse caminho.
VÍDEO-BÔNUS
Mhario Lincoln. Presidente da Academia Poética Brasileira
Jornalista e poeta.