Por: Mhario Lincoln e pesquisas da Editoria de Cultura.
No início do século XX, muitos críticos acostumados aos padrões tradicionais de versificação e rima tiveram dificuldades para compreender as inovações propostas pelo movimento modernista. Essa resistência frequentemente se manifestava na forma de análises que avaliavam a qualidade de um poema unicamente a partir de sua adesão aos modelos clássicos. Ao agir dessa maneira, deixava-se de lado toda uma dimensão de experimentação linguística e social que os poetas modernistas traziam em suas obras.
O crítico literário brasileiro Antônio Cândido, em “Vários Escritos” (1970), destaca que o valor de um texto não se limita à forma, mas também inclui a capacidade de revelar e questionar novas percepções do mundo. Segundo ele, o modernismo não desprezava os moldes antigos: em vez disso, procurava transformá-los de dentro para fora, abrindo caminhos de expressão mais amplos.
Da mesma forma, o ensaísta estrangeiro Harold Bloom, em “The Anxiety of Influence” (1973), aponta que cada geração de poetas se relaciona com as anteriores de modo tenso e criativo. No entanto, alguns comentaristas daquela década, confundiram esse processo de renovação com uma postura de ruptura total, o que levava a um entendimento limitado do interesse modernista.
Aqui, cabe um adendo para chamar para a mesma mesa meu conterrâneo Ferreira Gullar. Em seu livro “Vanguarda e Subdesenvolvimento” (*), Gullar discute a tensão entre as formas poéticas tradicionais e as novas linguagens que emergiram ao longo do século XX.
Nesses ensaios, o poeta maranhense enfatiza que a poesia moderna não se limita à recusa dos modelos clássicos; ao contrário, ela os questiona, reinventa e expande, buscando atender às inquietações e ao contexto histórico específico de cada época. Para ele, toda inovação significativa em arte emerge de uma interação dialética: de um lado, existe o legado estético e linguístico, do outro, a necessidade de renovação que brota das situações culturais e sociais do presente. Nesse sentido, o poeta moderno não despreza o que veio antes, mas reinterpreta esses elementos para compor uma nova visão de mundo.
"Não há modernidade sem diálogo tenso como o que veio antes. Ela nasce do confronto, mas também da continuidade."
(Parafraseado a partir das ideias presentes em Vanguarda e Subdesenvolvimento.)
De fato, é muito esclarecedora a colocação de Gullar porque muitos intérpretes do mesmo período cometeram o erro de comparar a produção literária moderna exclusivamente com as formas fixas do classicismo — como o soneto e a rima rigorosa — sem considerar que a poesia é, antes de tudo, expressão artística em permanente evolução.
Desta forma, para compreender completamente a poesia clássica que coexistiu ou antecedeu o modernismo, é crucial olhar além das regras de restrição formais e enxergar a inovação renovadora que a cirurgia requer em cada verso. Portanto, fico com o que diz Ferreira Gullar. Ou seja, todo movimento literário nasce em diálogo (e até em confronto) com o passado, até mesmo como herança clássica, o que deu uma nova vida aos modernistas. “Acolher diferentes vozes e formas de expressão cresceu o modernismo literário”, disse o autor de “Poema Sujo”.
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Crédito :
Texto produzido pelo editor sênior da Plataforma Nacional do Facetubes, com pesquisa da editoria de Cultura.