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O que há por trás da vida de Mário Vargas Lhosa, além da briga física com García Márques?

Neste texto, algumas curiosidades pouco conhecidas dos milhares de fãs do autor, que recebeu o Prêmio Nobel de Literatura.

Mhario Lincoln
Por: Mhario Lincoln Fonte: Facetubes
14/04/2025 às 18h47 Atualizada em 15/04/2025 às 09h46
O que há por trás da vida de Mário Vargas Lhosa, além da briga física com García Márques?
Google (Divulgação). G1

A Editoria de Pesquisa e Biblioteconomia da Plataforma Nacional do Facetubes 

 

Mário Vargas Llosa, falecido aos 89 anos em Lima, seu local de nascimento, foi mais do que um expoente da literatura latino-americana: foi um pensador inquieto, figura pública multifacetada e um dos últimos grandes nomes do chamado “Boom” literário que transformou a prosa hispano-americana em fenômeno mundial. Autor de uma obra vasta e plural, com romances, ensaios e crônicas que atravessam mais de seis décadas, Vargas Llosa personificou a rara junção entre o artista da palavra e o cidadão engajado. 

Nascido em 1936, conheceu o pai apenas aos dez anos e passou parte da infância na Bolívia, antes de retornar ao Peru e enfrentar a rigidez de um colégio militar – experiência traumática que viria a nutrir seu primeiro grande romance, A Cidade e os Cães, publicado em 1963. O livro causou furor em seu país: exemplares foram queimados no pátio da própria escola retratada na narrativa, o que apenas ampliou sua repercussão internacional. Desde então, Vargas Llosa ingressou na galeria dos autores que dariam projeção inédita à literatura da América Latina nas décadas seguintes.

 

A escrita sempre caminhou ao lado de sua atuação pública. Foi repórter policial aos quinze anos, revisor de epitáfios e professor em Paris. Essas múltiplas experiências o aproximaram tanto das contradições humanas quanto das estruturas de poder que ele se dedicaria a desmontar em romances como Conversa na Catedral e A Festa do Bode

 

Sua produção ficcional pode ser dividida em dois grandes eixos: a criação literária livre, moldada por um profundo domínio da técnica narrativa e pela observação crítica da condição humana; e a escrita permeada por sua visão política liberal, sobretudo após romper com a esquerda revolucionária nos anos 1970. Vargas Llosa acreditava que a literatura não devia servir a ideologias, mas sim ampliar o olhar sobre a vida. Defendia que um autor comprometido apenas com bandeiras políticas produzia obras datadas, enquanto o verdadeiro escritor busca, sobretudo, compreender as múltiplas formas de liberdade e opressão.

 

Ao longo da vida, Vargas Llosa aproximou-se de temas polêmicos e não hesitou em manifestar posições firmes. Disputou a presidência do Peru em 1990, perdendo para Alberto Fujimori. Desiludido com os caminhos do continente, tornou-se uma das vozes mais críticas dos autoritarismos, sejam eles de esquerda ou direita. Apesar do envolvimento político, reiterava que sua essência era literária, e não partidária. Em sua obra, a política aparece como pano de fundo para conflitos existenciais, e não como cartilha doutrinária. 

 

Sua consagração máxima veio em 2010, com o Prêmio Nobel de Literatura, concedido pela “cartografia das estruturas de poder e por suas vigorosas imagens da resistência, revolta e derrota do indivíduo”. O romance Conversa na Catedral, considerado por muitos críticos sua obra-prima, talvez sintetize com mais força sua proposta estética: como é possível viver sem se corromper em uma sociedade doente?

 

Na esfera pessoal, sua biografia foi quase tão extraordinária quanto seus livros. Casou-se aos 19 anos com Julia Urquidi, sua tia por afinidade, e depois com Patricia Llosa, prima em primeiro grau, com quem teve três filhos. Foi protagonista de um célebre rompimento com Gabriel García Márquez, a quem golpeou em um encontro no México, encerrando uma amizade que já fora profunda. 

 

Ao mesmo tempo, jamais deixou de reconhecer o talento do autor colombiano, a quem dedicou um ensaio extenso nos anos 1970. Uma de suas influências mais marcantes, pouco mencionada, foi o jornalista Carlos Ney Barrionuevo, boêmio das redações limenhas que lhe apresentou os grandes autores e incentivou sua formação autodidata. Vargas Llosa creditava a Ney grande parte de sua educação literária e sempre ressaltou que aprendera mais nas conversas noturnas do que nos bancos escolares.

 

O mundo perde não apenas um escritor premiado, mas uma figura que acreditava, com obstinada convicção, na força da cultura e da imaginação. Seus livros, traduzidos em mais de trinta idiomas, continuarão a ecoar nos debates sobre liberdade, identidade, memória e história. A literatura latino-americana – e a literatura mundial – não será a mesma sem Mario Vargas Llosa, cuja pena foi tão afiada quanto generosa, tão crítica quanto profundamente humana.

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Fontes: El País, The New York Times, Academia Sueca (nobelprize.org), Instituto Cervantes, BBC Mundo, El pez en el agua (autobiografia de Mario Vargas Llosa), Fundação Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes. Foto: G1.

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