Por Mhario Lincoln – Editor Sênior da Plataforma Nacional do Facetubes
Minha confreira Socorro Guterres me enviou uma foto emocionante. Relembrou-me quando fui 'cavalheiro' em sua linda festa de debutante. Isso me fez imediatamente lembrar que essas festas de 15 anos, estão definitivamente, em minha memória afetiva. Por isso, ao escrever este texto, impulsionado pelas saudades de uma época de ouro, fui tentando compreender esses eventos como importantes 'ritos de passagem'.
Muitas daquelas noites em que participei ativamente, seja como cavalheiro ou como anfitrião-apresentador de festas de debutantes coletivas nos salões dos clubes sociais Jaguarema, AABB, Lítero ou Casino Maranhense, na cidade de São Luís-MA, em começo de carreira de jornalista, revelaram tradições e emoções profundas.
Era o tempo em que a menina-moça deixava o colo da infância para surgir, deslumbrante, no salão — e nós, cavalheiros, éramos convidados a testemunhar essa travessia. Tive a honra de viver esse papel várias vezes, talvez por isso, o palco e as emoções dele advindas, tenham ficado gravados tão profundamente na minha alma.
Eu já disse que era realmente uma época de ouro. Havia uma essência vulcânica nessa geração. Literatura, Cinema e Artes em geral, borbulhavam entre os jovens adolescentes. O período ginasial, por sua vez, era um momento vibrante.
Exatamente aí, entrava também, as festas de quinze anos, especialmente na cidade de São Luís-Ma, sempre tradicionalista, como se tentasse recuperar suas raízes nas cortes da França (S. Luís é a única capital brasileira a ser fundada pelos franceses, segundo o entendimento de muitos e discordância de outros) e da Espanha, de cujo país também sofreu influência.
Por isso, na maioria das vezes, era uma cerimônia aristocrática que apresentava a jovem à sociedade, dizendo ao mundo: “ela está pronta”. Mas, pesquisando exatamente esse ponto: "ela está pronta", fui ler os estudos da American Psychological Association.
E lá fiquei sabendo que entre 11 e 15 anos ocorre o pico da puberdade feminina, com amadurecimento emocional e social. Detalhe: mais precoce do que nos meninos. Porém, outro estudo da Unicef, aponta que esse momento é vivido pelas adolescentes com uma carga emocional intensa: alegria, medo, vaidade, ansiedade e um forte desejo de pertencimento. Mutatis Mutandi, quem não queria ter sua festa de 15 anos comemorada? Nem só nos salões chiques da sociedade.
Participei de eventos lindos que não dependiam de grandes salões. Dancei valsas sob varais com lampiões improvisados. Provei salgadinhos e bolos preparados com carinho pelas tias da aniversariante. Até me emocionei ao saber que uma pessoa que gosto demais teve seu aniversário de quinze anos comemorado apenas ao lado da mãe e de um bolinho de fubá com uma vela de igreja.
Contudo, de uma forma ou de outra, em cada canto, a emoção era a mesma. A comunidade se reunia, em silêncio ou em música, para abençoar simbolicamente aquela menina em transformação. Como escreveu Martin Buber, “tudo o que é verdadeiramente vivido deve ser vivido entre pessoas”.
Coincidentemente li neste final de semana algo que se reportava a Heródoto e entre as páginas, achei algo interessante que veio me ajudar neste texto: esse rito de passagem feminino (15 anos) antecede até mesmo à tradição europeia, porque entre as Amazonas, (como diz Heródoto), a iniciação se dava com a montaria e as armas. Na Grécia antiga, Ártemis guiava as meninas rumo à vida adulta.
E sabem qual foi o baile de 15 anos que mais chamou a atenção na história antiga? O da debutante Marie Thérèse de Bourbon, em Versalhes, no século XVII, que reuniu os grandes nomes da nobreza, sob os olhos do Rei.
Foi exatamente isso - em todas as nuances anteriores e posteriores - que (re)vivenciei ao olhar, emocionado, as fotos da festa de 15 anos de Socorro Guterres. E agora, décadas depois, a vida traz de volta para aderir às memórias de um período grandioso para a juventude dessa época, um reencontro inesperado e grandioso através da Literatura: neste junho de 2025, tive a honra de receber Socorro como nova imortal da Academia Poética Brasileira. O tempo, esse fluxo invisível, acaba nos conduzindo a essas emoções imortais.
Por isso, Socorro, agora falando de forma direta a nova confreira, parabéns! O destino, às vezes, não apenas cruza caminhos. Ele reconcilia histórias, costura silêncios e fecha ciclos com responsabilidade. Como bem escreveu Fernando Pessoa: “O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem.” E essa intensidade, minha amiga, está eternamente gravada em nossa memória comum e na memória de nossas famílias amigas, as de ontem; e as de hoje!
Mhario Lincoln é presidente da Academia Poética Brasileira.