
Editoria de Pesquisa e Extensão da Plataforma Nacional do Facetubes
A resposta mais sensata seria um “sim” moderado. Mas, não é uniforme entre países, nem gêneros literários. Dados federais dos EUA mostram que, em 2022, 46,9% das mulheres leram romance ou conto, contra 27,7% dos homens, uma queda que vem de dez anos e que manteve quase 20 pontos de distância entre os sexos. Ou seja: elas seguem ancorando a ficção, enquanto eles migram — em parte — para leituras instrumentais, isto é, abordagem de estudo focada em habilidades específicas de leitura, usada para atingir um objetivo prático.
Na Europa, a vitrine do mercado confirma a tendência. Em 2023, segundo a Nielsen BookData, mulheres responderam por 65% das compras de ficção no Reino Unido, ao passo que os homens dominaram a não ficção, com 55% das vendas. O traço cultural por trás disso é explícito: a não ficção é percebida como investimento de autoaperfeiçoamento, “retorno imediato” para o tempo de leitura — o que ajuda a explicar por que eles a escolhem mais.
Essa abordagem não impede que alguns gêneros de massa explodam entre todos: o tsunami “romantasy” (subgênero literário que combina fantasia com romance, onde a história se passa em um mundo fantástico com magia, criaturas, reinos fictícios, mas o foco principal é a relação romântica entre os personagens, não a jornada do herói ou batalhas épicas), elevou as vendas globais de US$ 454 milhões (2023) para cerca de US$ 610 milhões (2024), impulsionado por leitoras jovens e pelo efeito BookTok, prova de que, quando a ficção conversa com desejo, mito e escapismo, o apelo é visível.
Ainda assim, pesquisas recentes insistem num ponto espinhoso: “muitos homens continuam evitando autoras mulheres”. (Pasmem!). Uma análise do Women’s Prize Trust sobre 54 mil compras de livros, concluiu que, enquanto leitoras compram obras de homens e mulheres em proporções semelhantes, leitores homens “favorecem amplamente autores homens e compram menos as principais escritoras contemporâneas”, replica a pesquisa.
Antes que se diagnostique uma “crise masculina da leitura”, convém estudar melhor o alarme. Uma checagem ampla mostra que homens leem ligeiramente menos do que mulheres e provavelmente também um pouco menos ficção, mas a diferença é menor do que o senso comum alardeia. Há, ademais, bolsões de contracorrente: ficção traduzida tem quase paridade de compradores, e gêneros populares como policial e thriller seguem atraindo públicos mistos. Em termos de hábito, o problema maior é outro e atinge a todos: a queda geral da leitura por lazer nas últimas décadas.
Esta matéria se originou após leitura de um artigo similar publicado no jornal “Público” Mas, como a matéria era restrita, a editoria tomou por bem ampliar o assunto, indo consultar evidências recentes puclicadas pelas agências Nielsen BookData, Women’s Prize Trust, NEA, Guardian e Vox, que apontam na mesma direção: mulheres puxam ficção — especialmente romance, fantasia e thrillers — homens preferem, em média, não ficção de “produtividade” e autores masculinos; e há exceções promissoras em nichos como a ficção traduzida e fenômenos de rede. Se desejar, envio depois os títulos específicos publicados no Público para acesso manual.
Para fixar a fotografia do mercado, a editoria também decidiu elaborar um quadro específico sobre o assunto, com participações por gênero em compras de ficção e não ficção no Reino Unido (Nielsen BookData, 2023). Ele ilustra, de forma simples e comparável, como as escolhas se distribuem hoje entre homens e mulheres.
Assim, em termos de ação, a mensagem para editoras, livrarias e projetos de leitura é pragmática: reduzir o “custo social” da ficção para homens (clubes e campanhas com embaixadores masculinos, curadorias por temas de interesse — esporte, ciência, negócios narrativos —, capas menos codificadas por estereótipos), ao mesmo tempo em que se torna irresistível aquilo que já seduz o grosso do mercado feminino: séries imersivas, universos expandidos, narrativa emocionalmente competente e experiências de comunidade. Em paralelo, corrigir o viés de autoria — com mais autoras em destaque, prêmios, crítica e listas — não é só justiça simbólica; é estratégia de crescimento. O futuro em que homens voltem à ficção, sem abrir mão do ensaio, passa por ampliar pontes: quando mais gente lê mais vozes, a literatura toda ganha.
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A editoria estudou as seguintes fontes:
Notas sobre as fontes: ficção por gênero nos EUA (NEA/SPPA 2022); participação de compras por gênero no Reino Unido (Nielsen BookData, via Dazed); viés de leitura contra autoras (Women’s Prize Trust, The Bookseller); tendência “romantasy” (Bloomberg, via UnHerd); checagem do debate sobre “crise masculina” (Vox); leitura por lazer em queda (Guardian).
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