O OUTRO LADO DA CAPA INVISÍVEL
*Mhario Lincoln
Uma das esperadas festas literárias deste começo, do último mês do ano, (01.12), na cidade de São Luís do Maranhão, a mais poética do Brasil, é o lançamento de "A Linguagem da Ausência" - novo livro do filósofo, poeta e membro efetivo da Academia Poética Brasileira, Rogério Rocha que "marca um ponto de virada na poesia do autor, exercitando múltiplas formas de dizer aquilo que está ausente, mas que mantém-se no mundo e na memória por intermédio da linguagem", como divulgado nos releases à imprensa.
Porém, há um detalhe explícito que o próprio Rogério divulgou e que me chamou a atenção: o fato de a capa (ficar) invisível até o lançamento, indo de encontro, até aqui - e isso pode se tornar algo mítico, se copiado - aos lançamentos literários comuns ao redor do Mundo: a capa como fator relevante de divulgação.
E o que isso significa, em meu bestunto?
A CAPA INVISÍVEL: a relação entre o fato e a suposição
A capa do livro "A Linguagem da Ausência", parece me levar a uma reflexão profunda sobre a natureza da representação física da linguagem e da estética. Claro que tais alegações me dão liberdade incólume de chamar a minha mesa de avaliação o filósofo alemão Immanuel Kant. Foi ele que explorou, primeiro, a relação entre a intuição sensível e o perceptível, na formação do conhecimento. Kant argumentou que nossa mente atua de forma ativa ao interpretar e organizar "as flores sensoriais", formando assim a nossa concepção do mundo. Isto é, quantas cabeças ávidas por conhecer o novo trabalho de Rogério Rocha, intuem sobre sua capa física, "envolvendo a percepção mental em um processo de interpretação, onde a suposição desempenha um papel fundamental", como argumenta Immanuel?
Com certeza ao montar essa estratégia de marketing, o autor passou por Arthur Schopenhauer, quem também levantou a premissa da importância da estética, argumentando que "(...)a arte e a estética nos permitem acessar uma dimensão mais profunda da realidade, transcender a vontade cega e alcançar a verdade(...)". Ora, a capa do livro, cujo título é fantástico - "A Linguagem da Ausência" - como objeto estético, pode provocar uma suposição intuitiva que nos leva além da superfície física, nos convidando a explorar o conteúdo oculto.
Porém, há se se falar sobre a responsabilidade individual, "na interpretação do mundo", como bem ensinou o existencialista Jean-Paul Sartre. Isso porque, as percepções individuais emergidas da capa de um livro (aliás, há estudos que demonstram que a capa tem 45% de chamamento), são moldadas por nossa própria perspectiva, experiências e expectativas.
Desta forma, a capa invisível da obra de Rogério me leva a intuir sobre a possibilidade de ser vista como um microcosmo da experiência humana, onde o fato e a suposição se entrelaçam, me desafiando a explorar os limites da compreensão e a descobrir a profundidade da linguagem e da expressão artística, mesmo que só, intuitivamente.
O CONTEÚDO AMOSTRADO
E o conteúdo? A partir da descrição da obra do poeta e filósofo Rogério Rocha, que recebi nos releases distribuídos à imprensa nacional, penso (intuitivamente) numa obra composta de uma linguagem contemplativa sensorial e lírica, para expressar o que está ausente, mas que permanece no mundo e na memória através dessa linguagem. Bem ao estilo de algumas das principais correntes poéticas e filosóficas.
A priori poderia encontrar nas páginas de "A Linguagem da Ausência", um Heráclito. E por quê? Porque a obra de Rogério Rocha é uma mudança de rumo em sua poética que, antes, já merecia aplausos. Foi Heráclito o enfatizador da "mudança constante no mundo", ou seja, "(...) não podemos entrar no mesmo rio duas vezes, pois tudo está em fluxo constante".
Preste bem atenção nessa frase de Heráclito. Não é tão simples como parece. Esse excerto acaba colocando desafios para a linguagem, que muitas vezes tenta descrever realidades constantes e imutáveis: "A gente não pode sair do mesmo tema e a poesia acaba virando uma epopeia interminável", disse-me um cordelista nordestino, acostumado a fazer trabalhos com 100 estrofes.
Com base nessas perspectivas poético-filosóficas e na descrição (divulgada) da obra de Rogério Rocha, apenas posso intuir - repito - que o autor explora a natureza da linguagem como uma ferramenta complexa e multifacetada que tenta capturar aspectos que estão ausentes ou "em constante transformação", como ensina Heráclito.
Muito parecido com "naturalis et insensibilis habitat", expressão dos estudiosos latinos, para esse tipo de abordagem lírica e sensorial, sugerindo uma tentativa de "ciere motus et sensus", que transcende a mera descrição objetiva. Por isso essa obra é, sim, o ponto de virada na poesia de Rocha, pois exercita múltiplas formas de expressão para comunicar algo que vai além das palavras.
A partir desse incrível título - "A Linguagem da Ausência", fico, cá com meus botões, ansioso para ler e ao mesmo tempo imaginar a essência de que a capacidade da linguagem de representar o que está ausente. Certamente, pode e deve ser uma forma de conexão com o eterno, o mutável e o transcendental. Destarte, Rogério Rocha acaba convidando seus leitores - a partir do título, repito - a refletir sobre como a linguagem pode ser uma ponte entre a ausência e a presença, entre o visível e o invisível, entre o efêmero e o eterno.
Parabéns, confrade.
Curitiba, madrugada de 28.11.2023
Mhario Lincoln, Presidente da Academia Poética Brasileira.