Eu e a namoradinha do Brasil - a atriz Regina Duarte
*Colunista Riba Um
Integrando o elenco do Grupo Cazumbá, criado e dirigido por Américo Azevedo Neto (bisneto de Arthur Azevedo), rumei para o Rio de Janeiro, onde fizemos apresentações dos espetáculos "Bugi Buá" e o "O Auto do Bumba Meu Boi" no Teatro Madureira. Eu interpretava o "Rapaz", o vaqueiro que cuida do animal preferido do "Senhor", o "Amo do Boi".
Na cidade maravilhosa um grave problema: um de nossos músicos, de nome Tabaco e que era presidente da Turma do Quinto, foi atropelado por uma bicicleta no Aterro do Flamengo e morreu. Terrível para todos nós. Mas tínhamos uma agenda a cumprir e Américo decidiu ficar no Rio para cuidar do traslado do corpo para o Maranhão e pediu-me que cuidasse do Grupo em São Paulo, nosso próximo destino.
Chegando na "Terra da Garoa" tive a primeira surpresa: as apresentações seriam no Teatro Maksoud Plaza, naquela época um dos hoteis mais requintados da América Latina, localizado nos Jardins. Como um nordestino ia se atrever a ir num lugar daqueles tão refinado? Pensei e acertei!
Estreamos para um público de cinco pagantes. Uma tristeza, já que a renda das bilheterias é que mantinha dos 38 membros do grupo. Fiquei desesperado, mas descobri uma saída. Fã da atriz Regina Duarte desde pequenininho, procurei no catálogo telefônico o endereço dela. Sem dizer nada a ninguém, na manhã seguinte peguei o álbum de fotografias do "Cazumbá", releases e matérias sobre nosso trabalho e rumei para o bairro da Lapa, onde ela morava numa casa toda branca, de muro baixo e um belo jardim. Tinha saído, me disse a empregada Itaci, que depois vim saber que era maranhense de Carutapera.
(Nessa foto, a colunista Flor de Lys, de quem Riba Um era muito amigo, com Regina Duarte, estilosa de "Porcina". Regina esteve em São Luís convidada para a "Noite das Personalidades", promovida por Flor).
Algum tempo depois ela chegou com a filha Gabriela, naquele tempo com 8 ou 9 anos de idade. Também esperando por ela estavam dois senhores, que tinham ido levar um conjunto de poltronas em ferro fundido, daquelas próprias para jardins. Apresentei-me, contei todo o drama para ela e pedi socorro. Com o jeito próprio de um aquariano ela foi direta: impossível conseguir alguma divulgação na Rede Globo, que tem uma agenda fechada com grande antecedência, o que é natural nas grandes corporações, que afinal só são grandes porque trabalham com planejamento.
Mas fez um bilhete e mandou que eu levasse na TV Bandeirantes, onde ela tinha amigos. Agradeci e me despedi. Os vendedores das poltronas de ferro fundido, que estavam num caminhão, perguntaram meu rumo e ofereceram carona. Subi na boléia e fui contemplando a cidade enquanto os dois discutiam porque a moça da casa Branca havia lhes pago com um cheque e não com dinheiro vivo. Perguntei se não sabiam de quem se tratava e o motorosta deu um freio tão brusco quando eu disse que aquela era a namoradinha do Brasil, que bati com a testa no párabrisa dianteiro. Após conferir o nome no cheque - Regina Blois Duarte - disse que iria perder aquele dinheiro, mas o documento ficaria para a mulher dele guardar a vida inteira. Sugeri que tirasse uma cópia e resgatasse o cheque. Foi o autógrafo mais caro da história.
Na TV Bandeirantes, procurei a pessoa a quem ela havia endereçado o bilhete e esperei a resposta. Que foi breve e positiva. Muito positiva. Mudariam toda a grade do programa "Boa Noite Brasil", que era apresentado por Babi Garrú, para que nós aparecessemos ao vivo e em cores naquele mesmo dia, afinal era um pedido de Regina Duarte, a maior estrela do país.
E assim aconteceu. Levamos o "Auto do Bumba Meu Boi" para a avenida Brigadeiro Luiz Antônio, mostramos a bela cultura popular maranhense ao Brasil inteiro e voltamos para a récita no Teatro Maksoud, a poucos quarteirões do Teatro Bandeirantes. Voltamos não, eu fiquei, porque a saudosa atriz e comediante Nair Belo exigiu que eu ficasse para ser entrevistado sobre aquela maravilha de espetáculo.
Cheguei no Teatro com as cortinas abertas e a casa cheia. Uma felicidade e uma emoção que poucas vezes senti. Primeiro por ver que tinha valido a pena a aparição da TV e depois por ver o quanto é bonito o nosso folclore, o fazer artístico do nosso povo. Dali para a frente, a direção do Maksoud Plaza nos autorizou a fazer as refeições no refeitório do hotel e até me deram um álbum com fotografias dos dois espetáculos, (cuja foto que ilustra este texto, estou caracterizado de Vaqueiro) e as coisas seguiram mansas até nossa partida para Olimpia, cidade paulista que sedia o maior festival de folclore do país e onde o Grupo Cazumbá é a atração mais esperada. E a mais aplaudida.
Pois é, Regina Duarte possibilitou a abertura daquela porta para mim, para todo o elenco do Grupo e para o Maranhao, que começava a mostrar sua cara para o Brasil e para o mundo. Coisa de aquariano.
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