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Título de Doutor “honoris causa” X de doutor

Raimundo Campos Filho (UFMA) e Renata Barcellos (BarcellArtes)

25/08/2025 às 07h19
Por: Mhario Lincoln Fonte: Renata Barcellos
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Renata Barcellos
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       Devido ao mau entendimento e ao uso indevido destes títulos (Título de Doutor "honoris causa" X de doutor), muitas vezes, há algum tempo eu e Campos refletimos sobre esta polêmica. Decidimos escrever a fim de distingui-los a partir da última reflexão em um encontro com o professor de História Reginaldo Dias pelo Instagram @reginaldosantos_dias. Passemos aos esclarecimentos:                                                                                                                     A expressão "honoris causa" (ou "Honorary Doctor", em inglês, abreviado como h.c.) é uma locução latina que, traduzida para o português, significa "por causa da honra". Essa é usada para indicar que um título, geralmente de doutor, é concedido como uma honraria, por instituições de ensino superior, em forma estatutária (exemplo: o Art.126, da Universidade Federal do Maranhão - disponível em https://portalpadrao.ufma.br/transparencia/institucional/estatuto-final-publicado.pdf), por indicação de uma personalidade encaminhado ao conselho universitário, a fim do reconhecimento aos méritos e contribuições notáveis para a sociedade ou para a própria universidade de uma pessoa em determinada área de atuação, independentemente de possuírem formação acadêmica. Um exemplo desta instituição foi a concessão do título ao consagrado poeta maranhense Salgado Maranhão, em 2022, na gestão do reitor da UFMA, professor Natalino Salgado. A concessão do título veio após resolução do Conselho Universitário, reunido em 10 de dezembro de 2021, por meio de videoconferência, a fim de reconhecer a figura de Salgado Maranhão pelos serviços prestados como personalidade intelectual, literária, cultural e educacional maranhense.                                                                                                      A pessoa que recebe o título pode usar a abreviação "Dr. h. c." e, se tiver também um doutorado acadêmico, pode usar "Dr. Dr. h. c.".  O título de Doutor Honoris Causa remonta à época do surgimento das primeiras Universidades Europeias. Cabe ressaltar que, inicialmente, estas eram vinculadas à igreja católica. Assim, nessa época, as universidades concediam a honraria como reconhecimento à relevância acadêmica de teólogos e filósofos daquele período. Por exemplo: entre 1478 e 1479, a Universidade de Oxford, na Inglaterra, já atribuía esse título ao bispo inglês Lionel Woodville, conhecedor do direito canônico, decano e reitor da Catedral de São Pedro em Exeter. A partir do século XVIII, com as reformas napoleônicas ocorridas nas instituições de Ensino Superior, o título passou a ser entregue também a pessoas de fora da academia.                                                                   Uma das primeiras instituições a conceder o título foi a Universidade de Sorbonne, por exemplo, a Alphonse Luisier.                                                                                               No Brasil, a primeira universidade a conceder o título foi a Universidade do Rio de Janeiro (posteriormente, Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ), em 1919, ao escritor Coelho Neto (natural de Caxias, MA, crítico, teatrólogo e renomado escritor e membro da Academia Brasileira de Letras, já tinha recebido pela Universidade de Coimbra, em 1910). Com o nome de Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ - criada pelo Decreto nº 14.343, de 7 de setembro de 1920, pelo presidente Epitácio Pessoa), em 1922, concedido a João Pessoa (importante intelectual e político brasileiro).

Características do título:

·       Reconhecimento de mérito: título é concedido em reconhecimento às realizações e contribuições excepcionais de um indivíduo em sua área de atuação. 

·       Sem exigência de formação acadêmica: pessoa homenageada não precisa ter um doutorado acadêmico tradicional para receber o título. 

·       Importância da atuação: título é concedido a pessoas que se destacaram em suas áreas, como ciências, artes, letras, filosofia, ou que tenham prestado serviços relevantes à humanidade, ao país ou à própria instituição. 

·       Relevância social e cultural: título pode ser concedido a figuras públicas, artistas, cientistas, líderes religiosos e outros indivíduos que tenham contribuído significativamente para a sociedade. 

·       Cerimônia de outorga: concessão do título geralmente envolve uma cerimônia formal, onde a pessoa recebe o diploma e o título de Doutor Honoris Causa. O título de Doutor Honoris Causa é uma forma de prestigiar e valorizar aqueles que, por meio de suas ações e realizações, deixaram uma marca na história e na sociedade. 

·       Não exige estudos formais: não é necessário ter concluído um doutorado ou qualquer outro curso acadêmico para receber o título. Dessa forma, trata-se de um título honorífico e não um acadêmico obtido após realização de processo seletivo em um curso de Pós-graduação strictu sensu, nível de doutorado, exigindo até 4 anos de estudo, pesquisa e defesa de uma tese em uma área específica. Desse modo, a palavra “doutor” é derivada do latim “docere”, que, por sua vez, derivou em “doctoris” (“mestre, o que ensina”).  

Com variações características, é utilizada em quase todas as línguas modernas: por exemplo: em inglês (doctor), espanhol (doctor), francês (docteur), italiano (dottore)        e alemão (Doktor).                                                                                                            Os doutorados mais antigos foram em direito civil e direito canônico, criados em 1223, na Universidade Bologna, a primeira do mundo ocidental. Os doutorados em medicina (M ) e Philosofia( Ph.D ) somente foram criados em 1875, ou seja, 652 anos depois dos de direito civil e direito canônico. A justificativa para o uso de doutor para advogados costuma ser um Decreto do Imperador Dom Pedro I para os concluintes dos cursos de Ciências Jurídicas. A tradição de chamar advogados de “doutor” surgiu nos tempos do Império, com uma lei de 11 de agosto de 1827, promulgada por D. Pedro I, a qual criava os cursos de Ciências Jurídicas e Sociais no Brasil. Com ela também se regulamentou o estatuto para o curso jurídico, além de ter sido decretado que os concluintes de cursos de bacharelado receberiam o título de “doutor”. Assim, bacharéis em Direito começaram a ser tratados dessa maneira.                                                                                          Decreto de Dom Pedro I (de 11 de Agosto de 1827): há um artigo e um capítulo específico sobre o tratamento de “doutor” para os bacharéis em direito, o artigo 9 e capítulo 13.                                                                                                                            Lei do Império (de 11 de agosto de 1827): “Art. 9.º Os que freqüentarem os cinco annos de qualquer dos Cursos, com approvação, conseguirão o gráo de Bachareis formados....”.                                                                                                                      Lei de 3 de outubro de 1832: já, sobre a Medicina, também há uma lei parecida para tais bacharéis em seu artigo 26: “Passados todos os exames, o candidato não obterá o titulo de Doutor, sem sustentar em publico uma these, o que fará quando quizer...”.                                                                                                     Também cabe ressaltar que, na atualidade, há instituições diversas como academias... concedendo a honraria. Essa prática é válida? Além disso, vale lembrar o decreto-Lei nº 3.481/1941, embora não trate diretamente da venda de títulos, estabelece que o título "honoris causa" é concedido por instituições de ensino superior para reconhecer méritos, e não para fins comerciais. A legislação brasileira não possui uma lei específica que proíba explicitamente a venda de títulos "honoris causa", mas a prática é ilegal por ferir princípios éticos e legais.                                                                                                       Na atualidade, também vale destacar alguns contemplados pela honraria do título honoris causa como os indígenas (dentre outros contemplados): Ailton Krenak, reconhecido intelectual e ambientalista, pela UnB; e Davi Kopenawa Yanomami, líder indígena e xamã, pela UFRR. As mulheres contempladas: Maria da Penha Maia Fernandes (ativista e farmacêutica) pela USP, em 2022; Marisa Monte, pelas USP, em 2024. As escritoras: Cora Coralina pela UFG, em 1982. Lygia Fagundes Telles (escritora pela UnB). Carolina Maria de Jesus, pela UFRJ, 2021. Nélida Piñon pela Universidade de Santiago de Compostela onde foi a primeira mulher a receber a honraria, em 1998... Os Maçons: Ademir Cândido da Silva (Grão-Mestre Geral Adjunto) e  Walderico de Fontes Leal (Secretário Geral do GOB, na época; e atual Grão-Mestre do DF) pela UNISCECAP, 2022. E as fraternas pelos trabalhos desempenhados na FRAFEM ainda não foi concedido o título. Fica a dica para o reconhecimento. Conheça as atividades desenvolvidas                  no site: www.gob.org.br.

Concluímos com as considerações de Aldo Bizzocchi (doutor em Semiótica e Linguística Geral pela USP com pós-doutorados em Etimologia pela USP e em Linguística Comparada pela UERJ e pesquisador do NEHiLP-USP – Núcleo de Pesquisa em Etimologia e História da Língua Portuguesa da Universidade de São Paulo (www.nehilp.prp.usp.br).blog Diário de um Linguista (www.diariodeumlinguista.com) e o canal do YouTube Planeta Língua (www.youtube.com/c/PlanetaLíngua).

Seu site pessoal é www.aldobizzocchi.com.br. E autor de livros):

“Essa é uma polêmica que agita o meio acadêmico há anos. De fato, pela legislação, só poderia portar o título de doutor quem fez doutorado. No entanto, por uma questão de tradição, médicos (e hoje também outros profissionais da saúde, como dentistas e psicólogos) são igualmente chamados de doutor - em inglês, por sinal, "médico" é doctor. E até há uma lógica nisso: após estudar seis anos em tempo integral, fazer mais um ou dois anos de residência, mais especialização, pode-se dizer que um médico estudou tanto quanto um doutor. A diferença é que ele não defendeu nenhuma tese. Quanto aos advogados, o costume de tratá-los por doutor vem do Brasil colônia e do império, em que medicina, engenharia e direito eram as únicas três profissões universitárias disponíveis (e por isso chamadas de "profissões imperiais"). E como os advogados eram frequentemente homens de posses e até políticos, a exigência do título era uma forma de esses indivíduos se destacarem da "turba ignara", da "plebe rude" No entanto, advogados que não tenham defendido tese são apenas bacharéis, e alguns até têm a humildade de assinar "Bel. Fulano de Tal". O fato é que numa sociedade colonialista como a nossa, títulos são muito importantes: o simples proprietário de terras no Nordeste é coronel mesmo que nunca tenha servido o exército; quando estacionamos o carro num restaurante, o manobrista logo nos chama de "doutor" (especialmente se o carro for importado). É a típica cultura de um país brega e subdesenvolvido, em que quem tem um olho - ou um título - é rei. Já “doutor honoris causa” é um título dado a quem, sem ter feito doutorado, demonstrou ao longo da carreira profunda proficiência em sua profissão. Por exemplo, Milton Nascimento é doutor _honoris causa_ em música pela Berklee School of Music e pela Unicamp”.                                                                    

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JaimeHá 3 meses BSB/DFUm texto rico em conteúdo e muito esclarecedor.
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